Uma decisão da Justiça estadual, considerada rara, vai levar uma mulher a sentar no banco do réus acusada de motivar um suicídio. O caso envolve personagens que estiveram envolvidos em um dos períodos mais conturbados da história do Espírito Santo, com denúncias de corrupção, pagamentos de propina e bens bloqueados. Fatos que se aliaram a traição e tragédia familiar.
No final do mês passado o Tribunal de Justiça negou o último recurso apresentado pela defesa de Juliete Ferreira Simões, de 34 anos. E manteve o julgamento em data ainda a ser agendada.
Em 2014 ela foi denunciada pelo Ministério Público do Espírito Santo (MPES) com o argumento de que mesmo estando ciente do “profundo estado depressivo” de Rosana Zazari Alves, a teria instigado ou induzido a pôr fim a vida. A morte aconteceu no condomínio Aldeia da Praia, em Guarapari, em julho de 2013.
Rosana era ex-esposa de José Carlos Cruz Alves. No processo ele conta que há anos tentava se separar dela, com quem teve três filhos, mas era impedido porque a ex ameaçava se matar. Foi neste contexto que ele conheceu Juliete, com quem manteve um relacionamento paralelo até sair de casa e formar uma nova família. O casal hoje tem dois filhos.
Há informações no processo de que Rosana sofria há anos com depressão e que já tinha atentado contra sua própria vida em outras três ocasiões. Uma condição que foi seriamente afetada por fatores econômicos e judiciais em que sua família foi envolvida.
Corrupção e propina
Rosana e José Carlos eram sócios-proprietários da TA Oil Distribuidora de Petróleo. Durante o governo José Ignácio Ferreira, a empresa esteve no centro de um escândalo envolvendo a acusação de recebimento de propina por parte do Executivo estadual. Houve denúncias contra o então governador e a primeira-dama Maria Helena Ferreira - autora do projeto da fábrica de sopas - e que foram acusados de cobrar propina para a concessão de regime especial de ICMS.
Em CPI instaurada na Assembleia Legislativa para apurar as denúncias, o casal da TA Oil afirmou que chegou a pagar para conseguir o benefício fiscal. Essa denúncia foi um dos principais pilares da crise que levou ao desmoronamento da credibilidade do governo José Ignácio Ferreira. Com o decorrer das investigações, ao longo de quase uma década, os bens do casal acabaram sendo bloqueados, o que acentuou a crise familiar.
Supostas ameaças
A prova mais importante do processo vem de uma suposta ameaça a Rosana, em uma ligação telefônica que teria partido de Juliette, quando teria dito à vítima “se mata que eu vou ficar com tudo que é seu”.
O advogado de defesa de Juliete, Fábio Marçal, garante que a ameaça nunca foi comprovada. “O telefone da vítima não foi encontrado e a operadora de telefonia informou ao juízo que ele não estava ativo na época. Os telefones não existem e não há pessoas no processo que tenham ouvido esta ligação”, afirma.
O MPES também informou não ter encontrado provas que incriminem Juliete e em julho do ano passado pediu que ela fosse impronunciada, ou seja, que não fosse a julgamento. O que não foi aceito pelo Juizado da Primeira Vara Criminal de Guarapari, que decidiu que ela deve ser julgada.
Para Marçal, houve uma trama arquitetada pela família, que vivia um momento difícil no aspecto financeiro e com a mãe doente, e que não aceitava a separação. Pouco antes da morte os filhos discutiram com Rosana, que não aceitava uma internação.
“Há dez anos Juliete cumpre uma pena sendo processada por um crime que não cometeu e do qual não se tem prova, o que vai ser apresentado aos jurados, e ela vai ser absolvida”, assinala.
A família
Ao longo do processo a família de Rosana garante que houve instigação ao suicídio. Eles são representados por um assistente de acusação, o advogado Nicácio Pedro Tiradentes.
“Não há dúvidas de que houve instigação ao suicídio. A Juliete ligou várias vezes para a Rosana, tanto para o telefone fixo quanto para o celular, mesmo sabendo do quadro de depressão. Não temos dúvidas”, assinalou.
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