Mães estão sendo obrigadas a entrar com drogas nas penitenciárias do Espírito Santo para quitar as dívidas dos filhos presos. Em muitos casos, elas acabam sendo flagradas nas revistas manuais ou nos equipamentos de scanner corporal — o body scan. E assim, as vítimas de extorsão acabam se transformando em criminosas.
São valores devidos pelo consumo de entorpecente. Em um caso o montante chegou a R$ 23 mil.
De acordo com a Secretaria de Estado da Justiça (Sejus), que é responsável pela gestão do sistema penal, mesmo com a intensificação da fiscalização nos dias de visitas e até nas revistas nas celas, ainda ocorre a entrada de drogas nas unidades destinadas aos que estão em regime fechado.
Tão logo é obtido, o material é comercializado entre os presos. E como eles não possuem dinheiro, a dívida de quem fez o consumo é paga pelos familiares: esposas, companheiras, namoradas, mas a grande maioria são mães.
A cobrança é feita do lado de fora dos muros, pelas esposas dos traficantes. “Há mães que fazem faxinas para quitar as dívidas dos filhos”, relata o secretário de Estado da Justiça, Rafael Pacheco.
Mas quando os valores vão sendo acumulados, e sem ter como pagar, elas se tornam alvo fácil. E mesmo que não tenham a intenção, se veem obrigadas, em razão das ameaças e da extorsão, a reabastecer as unidades prisionais com entorpecentes.
“O traficante poupa a própria família e sacrifica a de quem consome, que na maioria das vezes não é composta por criminosos. São pessoas humildes, que moram em áreas vulneráveis, ganham salário mínimo, e não têm como pagar valores que chegam a ser exorbitantes”, relata o secretário.
Dívida de R$ 23 mil
Os valores vão de R$ 100 a R$ 1.500, cobrados quinzenalmente, a medida do consumo do preso. Mas há casos como o de uma senhora do interior do Estado, cuja dívida chegou a R$ 23 mil. “Foi preciso um trabalho de inteligência para prender a esposa daquele que era o dono da dívida”, relata o secretário.
Outro problema é que estas mulheres acabam por demonstrar nervosismo na hora da revista. Atitude que vai acabar indicando a condição de transportadora. “Vai ser presa pelos policiais penais por tráfico. Saiu da condição de vítima e se tornou criminosa”, observa Pacheco.
O material ilícito é levado por quem foi cadastrado para as visitas. Há informações de que algumas mulheres recebem orientações das "esposas" do tráfico sobre como se portar, o que vestir, como transportar e até o que dizer em caso de desconfiança da equipe que faz a revista.
A droga é distribuída em pontos da roupa, e durante a visita, no pátio, encontram uma forma de entregá-la ao familiar preso. Mas há mulheres que conseguem burlar os mecanismos de segurança e entram no presídio com o pacote nas partes íntimas. E no quarto, com seu companheiro, o retira do corpo.
Na sequência o preso engole o produto, porque vai ser revistado ao término da visita. E na cela, o vomita, para depois dividi-lo em pequenas unidades, que equivale a parte superior de uma tampa de pasta de dente.
Com as dificuldades para obtenção do entorpecente, seu custo é mais caro. E cada unidade é vendida a R$ 50. Nos presídios é mais frequente o uso de:
- Maconha
- Haxixe
- Cocaína
Troca por alimento
Já os presos que não possuem família que possa arcar com as dívidas, acabam sacrificando os itens da alimentação que recebem diariamente. É uma situação que ocorre com menor frequência em decorrência do monitoramento feito pelos policiais.
Quando conseguem, comercializam as marmitas, o pão, os doces e os sucos. O valor varia de acordo com o produto e o cardápio do dia. Uma marmita com feijoada, por exemplo, é mais cara. E precisa lançar mão de vários itens para quitar uma unidade da droga, o que aumenta as chances de ser flagrado. Em média, o custo dos produtos fica na seguinte faixa:
- Doce – R$ 1
- Pão - R$ 2
- Marmita - R$ 15
Ações de combate
Foi por intermédio de denúncias variadas, além da observação de policiais penais e demais servidores que atuam nas unidades prisionais, que a Sejus identificou o problema.
Uma situação considerada nefasta pelo secretário. “O que acontece com esta extorsão é que ela está transcendendo a relação entre o traficante e o usuário de droga dentro do presídio, e chegando a família dele, fora dos muros das unidades. E não podemos permitir isto”, destaca.
Relata que a Sejus tem atuado de forma rígida para impedir a entrada de materiais ilícitos dentro das unidades prisionais, com revistas regulares nas celas e durante a entrada de visitantes.
Para isso, são utilizados equipamentos eletrônicos, como os scanners corporais, portas com detector de metais, entre outros, que auxiliam na identificação de drogas e demais objetos. “Mas há exceções que podem não ser identificadas nessa triagem”, observa.
LEIA MAIS COLUNAS DE VILMARA FERNANDES
Notou alguma informação incorreta no conteúdo de A Gazeta? Nos ajude a corrigir o mais rápido possível! Clique no botão ao lado e envie sua mensagem.
Envie sua sugestão, comentário ou crítica diretamente aos editores de A Gazeta.