Mulheres, negros, adolescentes — com idade entre 10 e 19 anos —, e pessoas com menor escolaridade formam o grupo de pessoas que tem maior possibilidade de contrair dengue em Vitória. O perfil social, traçado em pesquisa realizada em programa da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes), aponta ainda que regiões com alto risco de contrair a doença na Capital, em geral áreas com vulnerabilidade social. Outro dado que chamou a atenção é que há um rejuvenescimento entre os mais afetados, que usualmente eram os adultos e idosos.
De acordo com o estudo, a incidência da doença foi maior nas regiões de Santo Antônio e São Pedro, e posteriormente avançaram para o Centro e Maruípe. Houve também alto risco em Goiabeiras, ao passo que na região Continental não houve alta incidência em nenhum período estudado.
O que guarda uma relação direta com o perfil social, considerando que são áreas onde a maior parte dos que nelas residem são pessoas pretas e pardas, em casas precárias, em grandes aglomerados urbanos.
Prova da maior vulnerabilidade destas pessoas é que a pesquisa, assim como estudos de outros pesquisadores, mostram que regiões com maior presença de condomínios de apartamentos apresentam menor risco para a dengue, comparado a bairros com menor infraestrutura, que tiveram um crescimento urbano não planejado, relata a biomédica Lilyan C. Resende, responsável pelo estudo.
“É preciso garantir o acesso à água e esgoto a todas as populações, desenvolver estratégias de urbanismo que diminuam a chance de pontos de infestação do mosquito. Estruturar a pavimentação, o recolhimento de lixo, implementar ferramentas de arquitetura em casas de bairros com menor desenvolvimento econômico. Isso só mostra como a saúde coletiva é abrangente e deve ser multidisciplinar”, observa a pesquisadora.
A maior incidência da doença entre as mulheres é atribuída a sua presença mais frequente nas residências. Já em relação aos adolescentes, que apresentam risco maior de contrair a dengue em Vitória, revela uma mudança no perfil epidemiológico.
“Historicamente, com base em estudos que pesquisamos para o referencial teórico, no Brasil os mais afetados eram adultos e idosos, que provavelmente já passaram por outros eventos epidêmicos anteriores e possuem proteção imunológica, restando suscetíveis somente os mais jovens”, observa Lilyan.
Ela assinala que este deve ser um possível ponto de intervenção para as autoridades de saúde para ações de prevenção futuras, “Como por exemplo priorizar a vacinação para esse grupo de maior risco”.
Os dados
A pesquisa foi concluída no final do ano passado e divulgada no primeiro trimestre deste ano. Foram analisados dados de três anos a partir de 2018, sendo o ano de 2020 — também o momento da pandemia de Covid —. o momento em que foi registrada uma epidemia de dengue na cidade.
“O último ano que tinha tido um pico elevado da doença em Vitória foi em 2015, considerado bem elevado, e que acabou sendo superado em 2020”, relata a biomédica.
No período pesquisado foi constatada uma incidência (número de novos casos em um período de tempo) maior da doença. Confira:
- 2018 - 359,2 casos por cem mil habitantes
- 2019 - 2.018,3 casos por cem mil habitantes
- 2020 - 2.480,5 casos por cem mil habitantes
No último ano (2020), destacaram-se os os meses de janeiro e fevereiro, com 660,8 e 660,0 casos por cem mil habitantes, respectivamente.
O estudo, denominado “Características Epidemiológicas dos Casos Notificados de Dengue no Município de Vitória-ES no Período 2018-2020” foi desenvolvido como dissertação de mestrado da biomédica Lylian Resende, no Programa de Pós-Graduação em Doenças Infecciosas da Ufes.
O trabalho foi orientado pelo infectologista e professor Crispim Cerutti. Ele observa que foram analisados fatores determinantes envolvidos na disseminação da doença em Vitória e que sua importância reside no acompanhamento da dinâmica de transmissão da dengue, apontando áreas vulneráveis e indicando medidas de saúde pública capazes de reduzir os danos e atenuar os índices.
Cerutti destaca que a doença acomete a população de forma desigual e que a falta de infraestrutura urbana facilita a formação de criadouros de mosquito. “É um problema público que não depende só do cidadão fazer o controle do mosquito, é um problema a ser corrigido pelas autoridades públicas”.
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