
Em meio a conflitos internos, com lideranças que querem deixar o grupo criminoso — migrando para outras facções ou sendo independentes —, o Primeiro Comando de Vitória (PCV) tem uma nova cartilha com diretrizes para seus integrantes. Entre seus artigos, dois pontos chamam a atenção: a criação de uma espécie de conselho gestor e a decretação de que para sair da facção será preciso deixar o crime.
O material foi apreendido com Tiago de Jesus Fernandes, 29 anos, conhecido como Tiago Folha. Ele foi detido em uma ação da Polícia Civil no último dia 12, em Porto Canoa, na Serra, após retornar do Rio de Janeiro. É um dos chefes do PCV e tinha voltado para comandar bocas de fumo nos bairros Bonfim e da Penha, em Vitória.
A nova cartilha surge em meio a um conflito que atinge algumas regiões, causado por um racha no grupo criminoso. É o resultado da insatisfação por parte de algumas lideranças com a cúpula, cujos representantes estão presos em unidades federais fora do Estado.
Eles discordam das regras, das ordens, dos pagamentos e que eles não mais os representam. E querem deixar a organização.
Comumente a saída de faccionados só ocorre com a morte ou com a conversão, seguindo os princípios de alguma igreja. Pelas novas regras, isto só poderá ocorrer se cada um deles “deixar o crime”, situação que parece pouco provável por exigir que se abra mão das bocas de fumo, das armas e do lucro ilícito.
Segundo as investigações da Polícia Civil, após a decisão de saída, os antigos líderes receberam decretos de morte emitidos pela cúpula da facção e têm sido alvos de ataques.
Os impactos destas novas regras, segundo o delegado Romualdo Gianordoli Neto, titular da Subsecretaria de Inteligência (SEI), vêm sendo monitorados com muita atenção pela Secretaria de Estado da Segurança Pública (Sesp).
Conselho gestor
Foi a segunda vez que as forças de segurança apreenderam um texto com regras para os faccionados do PCV. O primeiro, datado de novembro de 2018, tinha 35 artigos e é conhecido também como estatuto. A versão recente é mais enxuta, com orientações distribuídas em dez artigos.
Mas o curioso é que os próprios traficantes estão com dúvidas sobre qual texto seguir, e se o atual é uma cartilha ou um novo estatuto.
Uma novidade que ele traz é a citação a um conselho gestor, que não existia até o momento. No passado havia a menção de que algumas decisões eram debatidas pelas principais lideranças, hoje detidas em presídios federais, mas não na configuração atual.
Ao conselho caberá a avaliação de todas as questões que envolvem o PCV. Decisões que vão desde a insatisfação dos integrantes, batismos bloqueados, impasses, guerras até o que chamam de “desembolo de ideias”.
É descrito que as “sentenças” precisarão ser tomadas com a presença mínima de três conselheiros.
A setorização é algo adotado por facções criminosas, como o Primeiro Comando da Capital (PCC), com suas diversas sintonias, cada uma responsável pela gestão de uma área ou setor.
Caixinha
A lista com as novas orientações diz que todos devem conhecer as regras, aplicações de disciplina, “para que saibam o que é permitido e o que não é”. Na anterior havia um longo texto, com informações sobre a criação do PCV e seus objetivos.
A sequência traz as informações sobre o pagamento mensal ao caixa da facção, destacando que precisará haver pontualidade, mas não cita valores, como no texto anterior. Mas é destacado que a facção “não têm obrigação de sustentar nenhum integrante”. A ajuda será para quem “merecer” e decidida pelo conselho.
LEIA MAIS COLUNAS DE VILMARA FERNANDES
Notou alguma informação incorreta no conteúdo de A Gazeta? Nos ajude a corrigir o mais rápido possível! Clique no botão ao lado e envie sua mensagem.
Envie sua sugestão, comentário ou crítica diretamente aos editores de A Gazeta.