O presidente Jair Bolsonaro segue errando, de maneira regular e obstinada. Parece ter compromisso com o erro. Na tarde deste domingo (19), deu seu endosso pessoal, de corpo presente, a uma manifestação abertamente contra a democracia. Discursou em apoio a um grupo de manifestantes radicais concentrados em frente ao Quartel General do Exército de Brasília, que pediam não só a reabertura do comércio e o fim do isolamento social (medidas de combate à pandemia do coronavírus) como também uma intervenção militar, o fechamento do Congresso Nacional e do Supremo Tribunal Federal.
Chamando as coisas pelo nome certo, o que eles querem é um golpe de Estado conduzido pelas Forças Armadas. E o presidente, democraticamente eleito, foi lá pessoalmente apoiar o protesto golpista.
Ao agir assim, persistindo no erro como se tivesse feito um pacto com ele, Bolsonaro insiste em zombar não só das medidas de mitigação da pandemia recomendadas pela OMS e por infectologistas do mundo todo, orientadas pelo próprio Ministerio da Saúde e corretamente adotadas por governadores. Debocha, também, da democracia e das instituições democráticas, flertando, levianamente, com o rompimento da ordem institucional – a exemplo do que ocorreu na Venezuela com Chávez e, depois, com Maduro. É um erro duplamente grave.
Reitera, ainda, outro comportamento: o de governar apenas para seu nicho de apoiadores e dialogar somente com eles, como um monólogo interior à bolha bolsonarista. O Brasil é muito mais amplo. A maioria dos brasileiros não apoia golpe militar nem de nenhuma espécie. Tampouco apoia o levantamento sumário das restrições para conter a pandemia. Tampouco aprovou a demissão do ministro Luiz Henrique Mandetta.
Curiosamente, o mesmo Bolsonaro para quem “minorias devem se curvar à maioria” (algo também muito questionável) agora se enclausura junto a uma minoria extremista. Fala cada vez mais somente a um grupo minoritário, menor a cada dia. É só ler as pesquisas de opinião dos mais diversos institutos.
Já que tem sido tão dado a “saidinhas”, o presidente faria bem em sair de vez em quando de dentro da própria bolha política. Seria bom que ampliasse o seu olhar. Já que tem feito questão de romper pessoalmente, todo fim de semana, o isolamento social, poderia também fazer um esforço para romper o isolamento político que tem imposto a si mesmo.
Reincidir nesse comportamento é, antes de tudo, um erro de cálculo político.
Um erro que pode lhe custar caro.
CONSTATAÇÃO
O presidente Bolsonaro não pratica isolamento social, mas isolamento político. Não respeita o distanciamento das pessoas; só da realidade.
NEM NO PRÓPRIO CLUBE...
Pratica também isolamento do resto do mundo. Na abordagem em relação à pandemia, encontra-se hoje isolado até em seu próprio clube, o dos líderes populistas de direita que ascenderam ao poder nos últimos anos em potências do Ocidente. Após semanas de negacionismo, Trump voltou atrás e se colocou de joelhos perante a realidade. Boris Johnson, do Reino Unido, chegou a enfrentar pessoalmente a Covid-19.
ROLÉ-TA RUSSA
Para reforçar a sua campanha pessoal contra o isolamento horizontal, o presidente tem dado “rolés” pelas ruas de Brasília. Fatalmente, sua presença em locais inusitados desperta o interesse das pessoas e promove aglomerações (o que ele quer). “Fatalmente”, aqui, pode ser tomado no sentido literal...
JEJUM DE PALAVRAS
No último domingo (12), durante uma celebração religiosa online, o presidente disse que o coronavírus "parece já estar indo embora" do Brasil. Na segunda-feira (13), o Ministério da Saúde anunciou 105 novas mortes no país causadas pela Covid-19; na terça (14), mais 204 mortes; na quarta (15), mais 204 mortes; na quinta (16), mais 188 mortes; na sexta (17), mais 217 mortes; no sábado (18), mais 206 mortes.
O presidente já estimulou jejum alimentar “contra o coronavírus”, no fim de semana passado. Voto de silêncio, no caso dele, talvez fosse mais produtivo.
MARCHA DA INSENSATEZ X MARCHA FÚNEBRE
Este vídeo pode te interessar
Notou alguma informação incorreta no conteúdo de A Gazeta? Nos ajude a corrigir o mais rápido possível! Clique no botão ao lado e envie sua mensagem.
Envie sua sugestão, comentário ou crítica diretamente aos editores de A Gazeta.