No lugar do tradicional "um minuto de silêncio", por uma coincidência dos deuses do futebol, neste final de semana tivemos uma "rodada de quase silêncio". O futebol brasileiro praticamente parou (apenas São Paulo e Avaí se enfrentaram) devido aos jogos da Seleção Brasileira exatamente na semana em que faleceu um de seus mais importantes personagens aqui do Espírito Santo.
Meu pai, Carlos Alberto Valente, filho de portugueses, iniciou sua carreira apitando futebol amador nos campos de futebol de várzea de Vila Velha, onde morava. Logo foi convidado para fazer parte da liga de futebol de Vila Velha como árbitro, e depois para fazer o curso de arbitragem na Federação de Futebol. Passou a ter como referência o grande árbitro Ozires Pizzol, de quem virou amigo mais tarde. Também ficou fã e amigo do lendário Gabino Rios, que foi seu professor.
Apitando futebol por todo o Estado, foi se firmando e se tornou árbitro da CBF, passando a viajar pelo país representando a arbitragem capixaba. Um de seus maiores feitos foi atuar como bandeirinha para o famoso árbitro Armando Marques em uma final entre Vasco e Cruzeiro. Com seu perfil rigoroso e com boas atuações se tornou o primeiro árbitro capixaba a fazer parte do quadro de aspirante a Fifa, em 1991.
Valente, como era conhecido, foi por alguns anos o principal árbitro capixaba no cenário nacional, e ao encerrar a carreira nos anos 90 se tornou professor da Escola de Árbitros Gabino Rios da Federação Capixaba, onde formou centenas de novos árbitros. Por insistência dele, também me tornei árbitro e passei a seguir seus ensinamentos técnicos e dicas sempre muito precisas. Admirado pelos amigos do apito, era sempre consultado pelos colegas e alunos sobre lances polêmicos em partidas de futebol.
Adoeceu em 2018 e perdeu a firmeza nas pernas, então passou a ficar muito tempo acamado, sempre assistindo jogos de futebol. Com a chegada do VAR na arbitragem, ele dizia: "que negócio bom esse", referindo-se à facilidade em apitar atualmente comparado com o tempo dele nos gramados quando era tudo decidido no olho e nos cartões vermelho e amarelo.
Faleceu aos 80 anos com a saúde física abalada, mas muito lúcido. Sempre com muita sabedoria, nos deixou muitos ensinamentos, sobretudo a retidão e a honradez com que sempre tratou a arbitragem e a vida. O Espírito Santo perdeu um ícone do futebol e eu perdi minha referência dentro e fora de campo.
No leito do hospital, prometi a ele que seguiria honrando o nome dele até os meus últimos dias. Como dizem os narradores, ergue o braço e finaliza o jogo Carlos Alberto Valente em mais uma grande atuação.
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Agradeço aos inúmeros telefonemas e mensagens que recebi dos colegas do apito de todo o Brasil, das entidades sindicais, federações de futebol, Confederação Brasileira de Futebol (CBF), ex-alunos, jornalistas, ex-jogadores e torcedores.
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