Eu sei, querido leitor, que você esperava que eu desse aqui meu palpite das campeãs pra este carnaval. Porém, o que eu aprendi em quase 20 anos de escolas de samba é que, tanto quanto uma premiação pode ser óbvia, ela também pode ser completamente imprevisível. Cabeça de jurado é terra onde ninguém se cria e onde regulamento manda. Então, prefiro aguardar, e guardar meus palpites para mim mesma.
Dito isso, ponho que é difícil destacar uma escola favorita quando o nível dos desfiles é muito bom. De fato, o que vimos vindo nos últimos anos no Carnaval de Vitória é uma crescente exponencial da qualidade técnica, do fazer plástico e intelectual dos enredos e sambas, além de emoções que se ampliam — e atingem cada vez mais pessoas — com a popularização dos nossos desfiles.
Tem que desapegar
Logicamente, temos escolas de samba com níveis diferentes de gestão, tradição, tradicionalismo e inovação.
Se de um lado, agremiações com boas gestões de diretoria e presidentes se destacam por unir suas comunidades — e, principalmente, as panelinhas —, do outro temos as que se destacam justamente pelo contrário: dificuldade de lidar com novas posturas, com novos tempos e com novas gerações que demandam mudanças nos comportamentos.
"A tradição é lanterna", cantam Zeca Pagodinho e Diogo Nogueira na canção de Moacyr Luz. Pois é: lanterna. Não corrente, nem bússola.
Tradição é valor imensurável, mas o apego excessivo a ela não é virtude. Tudo o que dialoga com o novo, cai no esquecimento. Vira peça de museu: lindo de olhar e lembrar, mas sem qualquer utilidade.
Pagando bem, gente boa tem
Digo isso porque, no processo pré-carnavalesco, algumas agremiações perderam quesitos excelentes por acreditar que o "amor" ao samba deve prevalecer em relação aos estudos, técnica e aperfeiçoamento.
Escolas com quesitos padrão ouro perderam seus profissionais porque não quiseram aumentar o pagamento. Em outras agremiações, os mesmos profissionais atingiram níveis elevados e remunerações compatíveis. "Aumentaram o passe", e deram retorno.
O que muitos gestores ainda arraigados precisam entender é que tudo custa dinheiro. Um mestre-sala e uma porta-bandeira precisam ir à academia para adequar o corpo ao objetivo da dança. Precisam de sapatos para treinar. Precisam de vale-transporte para ensaiar.
Um carnavalesco precisa comprar livros, precisa ter acesso à internet e fazer cursos de redação para redigir um bom enredo, além de estudar plástica, costura e artesanato para produzir boas fantasias, de fácil reprodução e que caibam no orçamento da escola. Comissões de frente precisam de aulas de dança, de lugar para ensaios, de transporte e de mantimentos. E assim por diante, em cada um dos nove quesitos.
Perde quem não investe nos seus, quem não reconhece os talentos que desabrocham e quem não valoriza o renascimento e desabrochar a cada sinal verde na avenida.
Penalizações
Neste carnaval, com desfiles que estão praticamente pau a pau, ganha quem comete menos erros e apresenta um desfile mais coeso.
É claro que uma escola que foi penalizada pode ficar à frente de outra, que não teve nenhuma penalidade, se os quesitos julgados obtiverem uma pontuação melhor. É possível que, na apuração, quem foi penalizado se iguale ou até supere a pontuação de escolas que foram menos pontuadas em cada quesito. No entanto, dessa vez, pelo menos metade das escolas deve chegar na apuração com décimos — e até pontos — a menos em relação às outras.
Detalhes
A primeira escola a entrar na avenida, a mais antiga e por isso tida como "mais querida" pelos sambistas, a Unidos da Piedade teve problemas em um dos carros alegóricos. A alegoria apresentou problemas desde a concentração, pendendo para os lados quando era empurrada. Como a escola continuou entrando na avenida, o desfile abriu um "buraco" antes da primeira cabine de jurados.
Além dos pontos em evolução que pode perder por causa disso, a escola pode ainda largar na apuração com, pelo menos, meio ponto a menos em relação às outras escolas por ter extrapolado o tempo de desfile.
O regulamento da Liga das Escolas de Samba do Grupo Especial (Liesge) prevê que a escola será penalizada em 0,1 por minuto ou fração de minuto extrapolado. A Piedade desfilou com 4 minutos e 57 segundos a mais em relação ao tempo máximo, que é de 62 minutos.
Sob o mesmo problema, a Unidos de Jucutuquara pode perder 0,2 por extrapolar o tempo de desfile, já que saiu da avenida com 63 minutos e 26 segundos. A escola também pode perder pontos em evolução na última cabine de jurados, já que apertou o passo para tentar passar dentro do tempo.
Novo Império também extrapolou o tempo limite em 1 minuto e 23 segundos, o que pode render uma penalidade de 0,2 ponto.
Uma das maiores penalidades pode recair sobre a Andaraí, que adentrou a avenida com o abre-alas desacoplado. Sem estarem ligadas, as duas partes são contadas como dois carros. A liga prevê que todas as escolas têm que ter três carros. O excesso ou ausência implicam em perna de pontuação. No caso da verde e rosa de Santa Martha, pode lhe custar um ponto.
Boa Vista, MUG e Chegou o que Faltava passaram dentro do tempo previsto — máximo de 62 e mínimo de 52 minutos de desfile.
Cabe recurso
A Liesge deve comunicar as penalidades às escolas ainda nesta segunda-feira (13). Cabe recurso.
Apuração
Com um corpo de jurados 100% carioca, os desfiles são avaliados em nove quesitos: mestre-sala e porta-bandeira, harmonia, evolução, alegorias e adereços, comissão de frente, fantasias, enredo, samba-enredo e bateria.
Na quarta-feira (15), a partir das 15h30, saberemos qual escola levou os melhores quesitos para a avenida. E, principalmente, se a excelência será suficiente para superar as penalidades.
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