Nos últimos meses, o mercado financeiro tem demonstrado crescente desconfiança em relação à política fiscal do governo brasileiro. O reflexo mais evidente desse sentimento é a valorização do dólar, que já acumula alta de 8,9% no ano, sendo 4,1% apenas nos últimos 30 dias.
Em janeiro, discutimos nesta coluna os fundamentos que poderiam levar a uma queda acentuada do dólar em 2024. Esses fundamentos, como a taxa Selic alta, preços robustos das commodities e exportações recordes, ainda estão presentes. No entanto, a moeda americana continua a se valorizar frente ao real, superando a média global. O que mudou?
O mercado não esperava uma deterioração tão acentuada das contas públicas. Em abril, o déficit nominal brasileiro atingiu níveis observados durante a pandemia, e a tendência é de piora. O governo se recusa a implementar medidas de controle do gasto público, focando-se apenas em aumentar a arrecadação, o que sobrecarrega ainda mais o setor produtivo.
O Congresso, por sua vez, tem rejeitado diversos projetos de aumento de receita, frustrando os esforços para zerar o déficit primário. O arcabouço fiscal aprovado no ano passado, que inicialmente acalmou o mercado, já foi comprometido nas discussões do orçamento deste ano.
Com o governo gastando mais do que arrecada, há um estímulo positivo na economia, que contraria os esforços do Banco Central para controlar a inflação. Isso resulta em taxas de juros elevadas, exacerbando o déficit nominal. As despesas com juros da dívida estão exorbitantes. Nesse cabo de guerra entre governo e Banco Central, a dívida pública cresce rapidamente, apontando para uma crise iminente. A moeda é a variável mais sensível nessa equação e, por isso, vemos o real se desvalorizar, aumentando a pobreza relativa da população.
É importante desmistificar a percepção de que o “mercado” é um ente conspiratório e mal-intencionado. O mercado é composto por diversos agentes, incluindo fundos que geram as aposentadorias de milhões de brasileiros e precisam se proteger dos sinais de risco.
Para financiar um governo que constantemente defende o aumento do gasto público, os investidores naturalmente exigem taxas de juros mais altas, pois maior risco demanda maior remuneração. Isso é especialmente verdadeiro em um momento em que a renda fixa nos Estados Unidos oferece juros atraentes em dólar. Quando os agentes detectam sinais de que o dólar e a inflação podem subir significativamente no Brasil, a reação inevitável é buscar proteção em mercados mais seguros.
A busca por aumento de impostos também aumenta a incerteza no ambiente de negócios. Quem investirá em novos projetos com o risco de ver a carga tributária multiplicar-se da noite para o dia? Sem regras do jogo estáveis, o investidor se retrai. Além do Executivo, o Judiciário também tem contribuído para a deterioração do ambiente de negócios. Menos investimentos diretos resultam em menor produtividade e, consequentemente, em maior inflação futura.
Estamos caminhando para mais uma crise. O momento de sua chegada e sua intensidade são incertos, o preço das ações na Bolsa já reflete boa parte do risco, mas o maior impacto por vir deve ocorrer via câmbio, com o dólar subindo cada vez mais, a menos que o Brasil enfrente de frente um ajuste nas contas públicas. Dado o histórico do PT e do presidente Lula, essa possibilidade parece remota. Assim, os juros devem permanecer altos por mais tempo, enquanto o dólar continua a se valorizar frente ao real.
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