O Banco Central encerrou o ciclo de baixa da Selic, sendo criticado por muitos e elogiado por outros. Juros são um remédio amargo, que pode matar o doente dependendo da dose. A questão é que a falta do remédio também é muito prejudicial. Encontrar a dose certa, considerando todos os múltiplos fatores envolvidos e a absoluta complexidade do tema, é o trabalho nada fácil do Comitê de Política Monetária (Copom).
Antes de arremessar pedras e crítica, é preciso entender o que está por trás da decisão. Há outros fatores que curam o doente além do remédio (neste caso, os juros). E também há fatores que o adoecem — e, nesse caso, a extensão e a trajetória da dívida pública do governo têm enorme influência.
Imagine que hoje a dívida pública federal está em R$ 6,6 trilhões, conforme dados publicados pelo site tesourotransparente.gov.br para o mês de abril/2024. Se a dívida fosse R$ 2 bilhões menor, para onde iriam esses recursos? Naturalmente, os investidores teriam que procurar outras alternativas, sejam de renda fixa, seja de renda variável, no Brasil ou no exterior. Podemos considerar que boa parte desse recurso seria destinada à renda fixa privada no Brasil, não pública, e irrigaria o sistema financeiro de dinheiro, forçando a queda dos juros na economia como um todo.
Se o governo tivesse uma dívida mais baixa, além de não ter que aumentar juros para atrair recursos, o seu risco seria avaliado como menor do que é hoje e isso atrairia outro tipo de investidor: o que procura títulos de alta qualidade. Hoje estamos fora desse mercado, porque não temos um rating considerado “grau de investimento”. Ou seja, somo um país de risco, especulativo, junk. A nossa taxa de juros não poderia ser baixa, porque, se nosso risco é alto, precisamos compensar pagando mais.
Outro fator tão importante ou até mais é a trajetória da nossa dívida pública. Ela está aumentando em relação ao PIB e as perspectivas de déficit fiscal não ajudam. Quão maior a dívida, mais necessidade o governo tem de emitir títulos. O governo promove leilões para emitir dívida, ofertando diretamente ao mercado através dos dealers, instituições financeiras mais relevantes, sendo este o instrumento utilizado para aumentar o endividamento.
Quanto mais leilões e com mais volume, mais altos são os juros de emissão de dívida, não tem outra saída. É visível como o nível de atuação do Tesouro nos leilões, considerando a estratégia de prazos e típos de títulos emitidos (pós-fixados, pré-fixados, ou inflação), influencia nos preços de mercado. E no final da contas, o governo paga os juros que o mercado pede. Por isso, precisa ser um emissor de qualidade, com dívida controlada e trajetória crível. Não é o cenário que vemos agora.
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