O debate sobre a dolarização da poupança volta à tona em um momento peculiar da economia global. Com os juros americanos em patamares elevados e a gradual redução da taxa Selic no Brasil, muitos poupadores se questionam sobre a melhor estratégia para proteger seu patrimônio. O cenário atual apresenta características que merecem atenção especial. Os Estados Unidos mantêm uma política monetária restritiva para combater a inflação, com reduções pequenas e espaçadas dos juros, mantendo o dólar forte globalmente. Esse movimento impacta diretamente as economias emergentes, incluindo o Brasil.
A volatilidade do câmbio, marca registrada do mercado brasileiro, adiciona complexidade à decisão. Nos últimos anos, as oscilações expressivas na cotação do dólar têm sido influenciadas tanto por fatores externos quanto por eventos domésticos, desde ciclos eleitorais até mudanças na política econômica. A diversificação em moeda estrangeira oferece vantagens consideráveis. A primeira e mais óbvia é a proteção contra eventuais desvalorizações do real. Historicamente, em momentos de turbulência, nossa moeda tende a se depreciar frente ao dólar, tornando os investimentos dolarizados uma espécie de seguro contra instabilidades econômicas.
Além disso, ao investir em ativos denominados em dólar, o poupador ganha exposição a diferentes mercados e economias. Essa diversificação geográfica reduz a dependência exclusiva do desempenho da economia brasileira, algo particularmente relevante em um mundo cada vez mais interconectado. No entanto, a decisão de dolarizar investimentos exige cautela e análise criteriosa. Os custos de conversão, incluindo spread cambial e eventuais taxas de corretagem, podem impactar significativamente o retorno, especialmente em operações frequentes ou de baixo valor.
A própria volatilidade cambial, que muitas vezes motiva a busca pela dolarização, pode se tornar um desafio. Assim como o dólar serve de proteção em momentos de desvalorização do real, também pode gerar perdas quando nossa moeda se valoriza. O investidor precisa estar preparado para essa dinâmica de duas vias. A tributação representa outro aspecto crucial nesta equação. Os ganhos em investimentos atrelados ao dólar estão sujeitos a regras específicas, incluindo imposto de renda sobre ganho de capital em caso de valorização cambial. O entendimento desta estrutura tributária é fundamental para uma decisão bem informada.
Existem hoje três caminhos principais para quem deseja dolarizar seus investimentos. O primeiro, e talvez mais acessível, são os ETFs de dólar, fundos negociados em bolsa que seguem a variação da moeda americana. Negociados como ações através de corretoras nacionais, oferecem boa liquidez e custos operacionais relativamente baixos. A segunda opção, relativamente nova no mercado brasileiro, é a conta em dólar mantida em bancos nacionais. Com a recente regulamentação do Banco Central permitindo contas em moeda estrangeira, algumas instituições já oferecem este serviço, facilitando operações internacionais e a manutenção direta de recursos em dólar.
Por fim, para investidores mais sofisticados, existe a possibilidade de investimento direto no exterior, através de contas em corretoras internacionais. Essa alternativa oferece acesso a uma gama mais ampla de ativos, incluindo ações, títulos e fundos mútuos americanos.
Quanto à proporção ideal de recursos a ser dolarizada, não existe uma resposta única. Especialistas costumam sugerir uma exposição entre 10% e 30% do patrimônio total para investidores moderados, percentual que pode variar conforme o perfil de risco e objetivos específicos. A definição desse percentual deve considerar diversos fatores: horizonte de investimento, tolerância a risco, objetivos financeiros e, principalmente, necessidades futuras em moeda estrangeira. Um investidor que planeja gastos regulares no exterior, naturalmente, pode optar por uma exposição maior ao dólar.
O momento atual reforça a importância de uma estratégia bem estruturada de diversificação. A dolarização pode ser uma ferramenta valiosa nesse processo, mas deve ser implementada de forma consciente e planejada, preferencialmente com orientação profissional. A decisão não precisa ser radical. É possível e recomendável manter um portfólio diversificado, com exposição tanto ao real quanto ao dólar, em proporções que façam sentido para cada perfil de investidor.
Mais importante que seguir tendências é construir uma estratégia de investimentos alinhada com objetivos de longo prazo e realidade financeira individual. Em um mundo cada vez mais globalizado, a exposição ao dólar deixou de ser uma decisão meramente especulativa para se tornar parte importante de uma estratégia abrangente de proteção patrimonial. O desafio está em encontrar o equilíbrio adequado entre proteção e oportunidade, considerando sempre as particularidades de cada investidor.
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