
A discussão sobre alternativas ao parcelamento sem juros no cartão de crédito ganhou força nos últimos anos, especialmente diante do cenário de altas taxas de juros e do endividamento crescente das famílias brasileiras. Embora ainda não exista uma proposta formal e definitiva para um "novo crediário" no país, o debate sobre o tema avança, com diferentes setores sugerindo modelos que possam equilibrar os interesses do comércio, dos consumidores e do sistema financeiro. O que está em jogo é a criação de uma alternativa mais transparente, acessível e digital ao atual sistema de crédito ao consumidor.
As discussões em torno do "novo crediário" giram em torno de alguns pilares centrais, que buscam modernizar a antiga modalidade de carnê físico e adaptá-la ao contexto digital e às necessidades atuais do mercado. Entre as principais propostas estão:
1. Plataformas digitais de crediário: a ideia é substituir o antigo carnê de papel por sistemas online, onde lojistas possam oferecer parcelamentos diretamente aos consumidores. Essas plataformas digitais permitiriam maior agilidade na contratação do crédito, além de facilitar a gestão das dívidas por parte dos clientes. Para o comércio, a vantagem seria a redução da dependência das operadoras de cartão de crédito e das altas taxas de intermediação.
2. Análise de crédito personalizada: diferente do modelo atual, em que as operadoras de cartão de crédito centralizam a análise de risco, no novo crediário cada loja ou rede varejista seria responsável por avaliar a capacidade de pagamento de seus clientes. Para isso, poderiam utilizar bureaus de crédito, como Serasa e Boa Vista, além de outras fontes de dados, como histórico de compras e comportamento financeiro. Essa análise personalizada poderia resultar em condições de pagamento mais adequadas ao perfil de cada consumidor.
3. Juros transparentes: um dos pontos mais criticados no atual modelo de parcelamento "sem juros" do cartão de crédito é a falta de transparência. Na prática, os juros são embutidos no preço dos produtos, o que encarece as compras à vista e distorce a concorrência. No novo crediário, a proposta é que as taxas de juros sejam explícitas, permitindo que o consumidor compare diferentes ofertas e escolha a mais vantajosa.
4. Integração com meios de pagamento digitais: o novo crediário também deve se integrar às modernas formas de pagamento, como Pix, boleto e débito automático. Essa flexibilidade facilitaria o pagamento das parcelas, reduzindo a inadimplência e aumentando a conveniência para o consumidor. Além disso, a integração com meios digitais permitiria maior controle sobre as finanças pessoais, com notificações e lembretes de vencimento.
Apesar das vantagens aparentes, a implementação de um novo modelo de crediário não está livre de desafios. Um dos principais obstáculos é a necessidade de regulamentação por parte do Banco Central, que precisará estabelecer regras claras para garantir a segurança e a transparência das operações.
Além disso, a adoção do crediário digital exigirá investimentos em tecnologia por parte dos varejistas, especialmente os pequenos e médios, que podem não ter recursos para desenvolver suas próprias plataformas. Outro ponto de atenção é o impacto sobre o sistema financeiro.
Com a redução da dependência do cartão de crédito, as operadoras e os bancos podem ver suas receitas diminuírem, o que poderia levar a um aumento de tarifas em outros serviços. Por outro lado, a maior concorrência no mercado de crédito poderia resultar em condições mais favoráveis para os consumidores.
Vale destacar que algumas redes varejistas já estão testando soluções de crediário digital, como Casas Bahia, Magazine Luiza e Via (Grupo Pão de Açúcar). No entanto, essas iniciativas ainda são isoladas e não fazem parte de uma reforma sistêmica do mercado de crédito. O desafio, portanto, é criar um modelo que possa ser adotado de forma ampla, beneficiando tanto grandes redes quanto pequenos comerciantes.
O debate sobre o "novo crediário" no Brasil reflete a busca por um modelo de crédito ao consumidor mais justo, transparente e adaptado às necessidades do mercado atual. Embora ainda não haja uma proposta definitiva, as discussões em torno apontam para um futuro promissor. No entanto, a implementação desse modelo exigirá cuidadosa regulamentação, investimentos em tecnologia e um diálogo constante entre os diferentes atores envolvidos. O objetivo final deve ser garantir que o crédito seja uma ferramenta de inclusão e desenvolvimento, e não um fator de endividamento e exclusão.
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