Como economista, tenho acompanhado com grande preocupação a trajetória dos juros reais no Brasil e a forma como contrasta com a situação de nossos vizinhos argentinos. É um tema que merece ser analisado em profundidade, pois traz implicações fundamentais para o crescimento econômico e o bem-estar da população. Vamos começar com os números. Atualmente, a taxa de juros real brasileira, ou seja, a taxa de juros descontada a inflação, está em torno de 8% ao ano. Sim, você leu corretamente: 8%! Essa taxa gritante é um dos grandes enigmas da economia brasileira.
Quais são os fatores por trás dessa discrepância? Bem, podemos apontar alguns elementos-chave:
1. Histórico inflacionário: O Brasil carrega consigo décadas de inflação alta e descontrolada, o que levou o Banco Central a adotar uma política monetária extremamente restritiva para tentar manter a estabilidade de preços. Isso se reflete diretamente nas altas taxas de juros.
2. Desequilíbrios fiscais: O Brasil enfrenta desafios crônicos no campo fiscal, com déficits públicos elevados e uma dívida pública que segue trajetória ascendente. Essa fragilidade fiscal acaba pressionando os juros para cima, na medida em que o mercado exige um prêmio de risco maior para emprestar recursos ao governo.
3. Percepção de risco: Infelizmente, a imagem do Brasil no exterior ainda carrega um certo grau de incerteza e desconfiança, devido à instabilidade política recorrente e à volatilidade macroeconômica. Isso faz com que os investidores demandem taxas de juros mais altas para compensar o risco percebido.
A Argentina vive o outro extremo. Nossos hermanos apresentam a taxa de juros real em -33,66%, fruto de uma inflação ainda alta e a taxa de juros nominal caindo bruscamente. Apesar da inflação anual estar em 200%, a taxa mensal está em 3,5% frente a 25% do final de 2023. Essa taxa de juros real é reflexo, principalmente, da redução brusca da taxa de juros nominal de 130% em dezembro de 2023 para 35% em novembro de 2024.
Essa disparidade tem sérias implicações para ambos os países. No Brasil, os juros altos encarecem o custo do crédito, dificultam os investimentos produtivos, freiam o consumo das famílias e, em última instância, prejudicam o crescimento econômico. Já na Argentina, juros reais negativos dificultam a atração de dólares, mas a expectativa de melhora das condições macroeconômicas facilita a retomada do crescimento, embora traga o risco de eventual aceleração inflacionária.
A redução consistente da taxa de juros real é um grande desafio para a política econômica brasileira. Historicamente, o país lida com alta inflação, o que exige que o Banco Central mantenha taxas de juros elevadas para tentar controlá-la. Além disso, o desequilíbrio das contas públicas e o alto nível da dívida pública contribuem para juros mais altos, devido à percepção de risco elevado. Fatores políticos, institucionais e de governança também afetam a credibilidade do Brasil perante os investidores, pressionando os juros.
Para criar um ambiente mais favorável à queda sustentada dos juros reais, o país precisa de reformas abrangentes, envolvendo políticas fiscais, monetárias e estruturais, que melhorem a produtividade, a eficiência do sistema financeiro e a confiança dos agentes econômicos. Trata-se de um desafio complexo que demanda persistência e coordenação de políticas públicas de longo prazo.
Somente assim poderemos caminhar em direção a uma taxa de juros real mais compatível com o nosso potencial de crescimento e desenvolvimento. Esse é um desafio que precisa ser encarado com determinação e visão de longo prazo, para que possamos finalmente resolver o enigma dos juros reais e colocar a economia brasileira em uma trajetória mais próspera.
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