Uma das principais regras de bolso para quem investe no mercado de ações é que o mercado tende a subir quando os juros caem e tende a cair quando os juros sobem. Essa correlação negativa entre as duas variáveis foi verificada diversas vezes no passado e tem bons fundamentos teóricos — que já foram discutidos em artigos anteriores.
Com isso em mente, e na iminência do início de um ciclo de cortes de juros pelo Banco Central, os investidores aguardavam ansiosamente para coletar seus ganhos no mercado acionário. Mas, mais de um mês após o primeiro corte de juros, pode-se dizer que a expectativa foi frustrada.
No dia 2 de agosto, o Copom cortou 0,5 p.p., levando os juros para 13,25% a.a. e, no último dia 20, repetiu esse movimento, cortando a Selic para 12,75% a.a. No mesmo período, o índice Ibovespa saiu dos 121.000 para os 116.000 pontos, uma queda de quase 5%. Diante disso, fica o questionamento de se a regra de ouro do mercado de capitais está perdendo sua eficácia no curto prazo.
Para responder a essa isso, devemos nos perguntar sobre quais juros estamos falando quando assumimos que estes têm relação inversa com a performance das empresas na Bolsa. Muitos investidores assumem que os juros dessa relação são a taxa básica da economia, a Selic.
Entretanto, como empresas são projetos de longuíssimo prazo, faz pouco sentido pensar que a taxa corrente de juros deveria ter um grande impacto no valor da companhia, que é função da sua geração de resultados em um período indeterminado. Assim, ao avaliar uma empresa, faz mais sentido pensar em qual é a expectativa de juros para um prazo mais longo, que o mercado adota: 10 anos, por convenção.
Ao analisarmos a expectativa dos juros de 10 anos no Brasil (que inclusive são negociados em Bolsa), vemos que a regra de ouro continua fazendo sentido. No mesmo período em que a Selic caiu de 13,75% para 12,75%, os juros de 10 anos saltaram de 10,74% para 11,6%. Ou seja, as expectativas do mercado para os juros futuros deterioraram mesmo com os juros correntes caindo.
Esse é um fenômeno que, apesar de ser contraintuitivo, não é incomum. Quando o mercado julga que o corte de juros é feito de maneira precipitada, um dos possíveis reflexos é uma alta nos juros projetados para o futuro. A intuição por trás desse movimento é a ideia de que o corte precipitado pode provocar um cenário inflacionário que terá que ser contido com altas de juros no futuro.
É por esse motivo que o BC deve ser responsável e só cortar juros quando tiver os fundamentos econômicos necessários para realizar tal movimento. Adicionalmente, contribuem para a alta dos juros futuros o aumento de preocupações sobre a trajetória da dívida pública brasileira e a escalada dos juros de 10 anos americanos, que atingiram máximas nas últimas semanas.
A moral da história é que para investimentos em ações, as regras de bolso devem ser olhadas com muito cuidado e que, em matéria de juros, o investidor deve estar muito mais atento às variações das expectativas de juros do que aos movimentos da taxa Selic.
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