Quando uma companhia aberta decide distribuir dividendos, ela sinaliza para o mercado seu potencial de geração de caixa futuro. Dividendo, afinal, é uma fatia do lucro do período. Se a empresa distribui riqueza ao acionista, ela abre mão necessariamente do dinheiro que poderia reinvestir em suas operações, o que a faria crescer mais, quando falamos em escolhas de projetos de expansão sólidos.
Do ponto de vista do investidor, dividendo significa caixa hoje na mão e isenção de imposto de renda sobre esse ganho, pelas regras vigentes. No fim do dia, tudo parece muito bom. Mas por que nem toda empresa emite dividendos? É rentável para o investidor em Bolsa comprar ações que pagam dividendos?
A Vivo (Telefônica) tem sido uma das empresas mais recomendadas pelas casas de análise neste mês de abril/22. Os analistas a consideram barata e com dividend yield (rentabilidade sobre o preço) alto. A Vivo pagou nos últimos 12 meses R$ 3,4 por ação em forma de dividendos. Logo quem tinha 1.000 ações da Vivo foi remunerado com adicionais R$ 3.400 em um ano.
Isso sem ter que se desfazer das ações, uma vez que dividendo não é ganho de capital. Dividendo é caixa para o acionista; ganho de capital é a diferença entre o valor de venda e de compra de uma ação. Outros ativos também são conhecidos pagadores de dividendos históricos: Banco do Brasil, Vale, Itaú, Copel, e mais.
Para entender o que norteia uma política de dividendos de uma companhia, um investidor precisa examinar alguns pontos. Vamos a eles.
Taxa de payout é o primeiro item. O payout é o pedaço do lucro que é pago em forma de dividendos. Se uma empresa lucra R$ 100 por ação e distribui R$ 25 desse montante aos acionistas para cada papel, sua taxa de payout de dividendos é de 25%. Quanto maior o payout, menor é o reinvestimento da empresa.
A alocação de recursos da firma é intertemporal: se o payout é alto, o acionista fica feliz hoje, mas pode ficar infeliz amanhã, se a empresa não mantiver níveis de reinvestimentos eficientes. Firmas que reinvestem menos hoje nas operações podem minar seu crescimento futuro e arruinar ganhos de capital para investidores. É uma faca de dois gumes. Resumindo: dividendo é bom, sinaliza o quanto de riqueza tem a firma, mas dividendo em excesso condena a rentabilidade futura do negócio, e pode se tornar uma armadilha.
Nesse sentido, cuidado com a trapaça do payout. Algumas empresas aumentam seu payout, anunciam políticas de dividendos agressivas. Isso atrai acionistas que têm gosto por dividendos. Mas há de se perguntar se essa empresa tem condições financeiras de sustentar esse pagamento ao investidor por longos períodos.
Não se mexe abruptamente em política de dividendos. Empresas que fazem isso podem estar tecendo a teia para captar recursos hoje, resolver problemas financeiros, mas depois deixar de gerar caixa no tempo. Por isso, dividendos nunca podem ser analisados sozinhos: endividamento, liquidez, risco, fluxo de caixa, crescimento da receita, preço-lucro, tudo isso tem que estar na planilha do investidor que está pensando em comprar ou não uma ação que paga dividendos.
A Souza Cruz, fábrica de cigarros, já teve uma taxa de payout de mais de 100% do lucro. Essa empresa pagou aos acionistas R$ 42,3 milhões em dividendos em 2005, montante maior do que seu lucro. Acontece que o mercado de cigarros está em decadência. O cigarro já não é, há muito tempo, um consumo que gera status, nem sequer bem-estar. Culturalmente, não é bem aceito em muitos países (os franceses são os franceses, claro). Então, altas taxas de reinvestimento não justificam uma tentativa potencial de crescimento. Pagar dividendos foi a saída para a Souza Cruz atrair investidores.
O dividend yield da Souza Cruz chegou a 12,4% ao ano, em 2006. Maior que a taxa Selic em muitos momentos da histórica do juro básico. Ou seja, é possível encontrar ativo de renda variável pagando caixa (dividendo) ao acionista superior ao que um ativo de renda fixa pagaria. Dá para desconfiar? De duas uma, a preço de hoje: ou a taxa de juro básica está baixa demais (o que não é o caso hoje, nem historicamente falando); ou a empresa está sacrificando seu reinvestimento no longo prazo.
Pode ser ruim para uma empresa não reinvestir muito? Depende. Tomemos a mineradora Vale com exemplo. Empresa com fluxo de caixa elevado, vive um momento relativamente bom de vendas, é uma das poucas mineradoras do mundo (esse mercado não é, por natureza, competitivo), tem anos e anos de operação no mundo todo. É uma empresa madura. É natural e esperado que sua taxa de reinvestimento possa ser mais baixa.
Agora, pense em uma empresa jovem. Com pouca história e poucos anos de atuação na Bolsa. Seu objetivo é crescer de forma exponencial, ganhar fatia de mercado. Distribuir dividendos em excesso não parece ser razoável nesse caso, reinvestir parece um plano mais adequado. Então, se uma empresa jovem, com fundamentos (alavancagem, liquidez, etc.) deteriorados, começar a anunciar payouts elevados, desconfie. Pode ser injeção na testa...
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