Assessor e Especialista em investimentos da Valor. Diretor do IBEF-ES (Instituto Brasileiro de Executivos em Finanças). MBA pela PUC (RS) em Finanças, Investimentos e Banking

Brasil precisa de política sustentável para crescer e controlar inflação

As perspectivas para o IPCA continuam desafiadoras, reforçando o cenário de taxa Selic em 13,75% até o final do ano

Vitória
Publicado em 10/03/2023 às 07h55
Sem arcabouço fiscal, o risco é a inflação crescer junto com a dívida pública
Sem arcabouço fiscal, o risco é a inflação crescer junto com a dívida pública. Crédito: Freepik

Homo economicus é o nome dado a um conceito teórico segundo o qual os homens são completamente racionais e sempre tomam decisões financeiras com base na razão. Nessa teoria, o indivíduo busca atingir metas específicas com foco no seu bem-estar ao menor custo possível.

Será que esse conceito pode ser aplicado à realidade? Se levarmos o tema para o lado fiscal veremos algumas disfunções no atual governo.

As tensões entre o Poder Executivo e o Banco Central (BC) amenizaram. O presidente Lula reduziu o tom de críticas, enquanto Roberto Campos Neto, presidente do BC, tem repetido que a autoridade monetária e o governo devem trabalhar juntos. Fernando Haddad, ministro da Fazenda, teve sucesso na mediação.

Os fundamentos econômicos por trás da disputa, no entanto, não mudaram. Eis o desvario fiscal: o governo continua a sinalizar uma política fiscal expansionista, incluindo medidas para aumentar a renda disponível e reduzir o endividamento das famílias e das empresas. Gastos excedentes implicam no aumento da dívida pública e, consequentemente, irresponsabilidade fiscal. Essas medidas podem diluir o impacto da política monetária, exigindo uma condução de juros mais rígida à frente.

Uma questão chave é o comportamento das expectativas de inflação. Até o momento, as projeções do mercado caminham em direção ao que se acredita ser a próxima meta de inflação, ou seja, entre 4,0% e 4,5%. Eis a razão encontrada no homo economicus, ou seja, demanda-se uma política fiscal sustentável e crível para os próximos anos.

Caso contrário, as expectativas ficarão acima da nova meta, refletindo o risco de uma saída inflacionária para o crescimento da dívida pública. Fernando Haddad prometeu apresentar o novo arcabouço fiscal ainda março. A proposta deve ser apresentada ao presidente Lula na próxima semana. Até então, estamos entre a razão e o desvario fiscal no país.

As perspectivas para a inflação continuam desafiadoras, reforçando o cenário de taxa Selic em 13,75% até o final do ano. Contudo, a pressão política é crescente. Em outras palavras, uma nova regra fiscal crível e sustentável poderia abrir espaço para flexibilização monetária mais cedo, no segundo semestre deste ano.

Um adendo. Foi Lionnel Robbins quem elaborou a seguinte premissa: “possibilidades distintas oferecem incentivos distintos e esses incentivos podem ser arranjados em ordem de intensidade. Robbins foi o estudioso que distinguiu os tipos de Homens Econômicos do Psicológico e Lógico, criando a famosa definição sobre economia: “economia é a ciência que estuda o comportamento humano como o relacionamento entre fins dados e meios escassos que têm usos alternativos”.

No Brasil, a atividade econômica segue em desaceleração. Os recursos para gastos certamente serão mais escassos. Após o crescimento do PIB de 2,9% em 2022, há projeções de alta de 1,0% em 2023 e 0,8% em 2024. O déficit primário do setor público deste ano tende a girar em torno de 1,0% do PIB, devido ao aumento dos gastos do governo central. A partir de 2024, uma regra fiscal que controle as despesas é chave para a sustentabilidade da dívida pública.

O filófoso inglês Jeremy Bentham (1748-1832) levou adiante a premissa de Robbins, concebendo um ser humano que atua em função de um equilíbrio perpétuo entre prazer e dor: o que de fato importa são as consequências dos atos, ou a capacidade de obter prazer e fugir do sofrimento.

Assim, todas as decisões humanas seriam informadas por esse cálculo essencial, a tal ponto que serviria para definir o ser humano como racional. Essa nova definição permite aplicar sobre o objeto assim postulado uma série de operações determinadas por esse cálculo: simplificando-o, descomplicando-o e, enfim, tornando-o mais previsível. Assim nasce o homo economicus. Nas paragens brasileiras, por enquanto, continuamos entre a razão e o desvario fiscal.

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