O pragmatismo de Lula prevaleceu ao apoiar de um lado, o deputado Arthur Lira (PP-AL), vencedor na Câmara dos Deputados e, de outro, o senador Rodrigo Pacheco (PSD-MG), vencedor no Senado. No entanto, paz e bonança passam ao largo da atual cena política brasileira.
A história político-econômica se movimenta por meio de ciclos. Vejamos o exemplo do rei e general grego, Pirro (318 a.C. – 272 a.C.). Pirro ficou famoso por ter sido um dos principais opositores do Império romano, cujo domínio geopolítico na Itália não estava consolidado. A vitória de Pirro contra os romanos na batalha de Heracléia foi obtida por um alto preço, acarretando de prejuízos irreparáveis ao rei e à nação.
Não precisamos ir tão longe no tempo. Em 2015, por aqui, a ex-chefe do Executivo Dilma Rousseff apoiou Eduardo Cunha à eleição da Câmara dos Deputados, sendo este depois, mesmo com a ajuda anterior da presidente, o principal artífice da abertura de impeachment contra ela.
Lula não é Pirro, muito menos Dilma. No entanto, sua agenda de prioridades no início dos trabalhos legislativos, dentre elas a reforma tributária e o controle da dívida pública via nova âncora fiscal, ainda não apresentada pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, dirão à frente se as vitórias do presente colherão boa fortuna a posteriori. 186 é a somatória de deputados do Partido Liberal (PL), Republicanos e Progressistas (PP) que formaram a base do governo Bolsonaro no Congresso. Nesse sentido, as tratativas prometem ser longas neste mês de fevereiro.
O valor de R$ 9,85 bilhões é outro dado importante, pois corresponde o montante que sobrou das antigas emendas do relator e que acabaram sendo incorporados ao orçamento dos ministérios. Para bom entendedor, boa cifra basta. A grana vai virar moeda de troca assim como ocorria no governo anterior. Questiona-se: as duas pautas prioritárias do novo governo ditas acima sairão imaculadas? Em 2022, o STF (Supremo Tribunal Federal) declarou que essas emendas eram inconstitucionais. A ver qual será o pacote de bondades que o governo Lula dará aos parlamentares.
Para além do balcão de negócios políticos, o discurso político de um chefe de Estado tem imenso poder de ser contraproducente ou eficiente ao desenvolvimento econômico do um país. É sabido que Lula quer se livrar do teto de gastos e tocar assuntos econômicos caros à esquerda. Todavia, fica cada vez mais evidente a persona non grata do Executivo em relação ao mercado. A retórica beligerante gera instabilidade ao Banco Central (BC), por conseguinte à conduta econômica do país, recaindo sobre o cidadão trabalhador brasileiro.
Temos três exemplos da balbúrdia dos últimos dias proferidos por Lula:
- “Qual é
a explicação de a gente ter um juro de 13,5% [13,75%] hoje? O BC é
independente, a gente podia não ter nem juro. Não existe
justificativa nenhuma para que a taxa de juros esteja em 13,5%. É
só ver a carta do Copom para a gente saber que é uma vergonha esse
aumento de juro.” [Lula]
- “Quero saber do que serviu a independência. Eu vou esperar esse cidadão [Roberto Campos Neto] terminar o mandato dele para a gente fazer uma avaliação do que significou o BC independente.” [Lula]
- Naquele tempo [mandatos anteriores], era fácil jogar a culpa no presidente da República. Agora, não. A culpa é do BC. Agora, é o Senado que pode trocar o presidente do BC”. [Lula]
Lula perdeu o timing e a oportunidade em fazer uma reunião protocolar com Roberto Campos Neto. Com a escalada do tom após a reunião do Copom (Comitê de Política Monetária) e divulgação da manutenção da taxa Selic, o atual presidente se esqueceu que à época de Henrique Meirelles, o Comitê fixou como até hoje fixa a taxa de juros para segurar a inflação, esse sim, uma vergonha.
Lula mencionou o fato de que a Selic aumentou, o que não é verdade. Aumento da Selic ocorreu em janeiro de 2003, em seu primeiro mandato, quando o Copom a elevou de 25% para 25,5%. Ao Banco Central cumpre o controle da taxa de juros, pois afeta o custo de crédito para empresas e pessoas. Ou seja, juros mais altos tornam o crédito mais caro, o que reduz a demanda por bens na economia, arrefecendo a pressão sobre os preços, diminuindo a inflação.
A Ata da 252ª reunião do Copom, divulgada na manhã de terça-feira (07/02) disse que as expectativas importam e, quando elas pioram, a economia tende a sofrer. No 12º parágrafo, o Comitê resolveu deixar de lado o discurso neutro, informando que notou “com especial preocupação” a deterioração das expectativas de inflação. Entre as causas: “uma possível percepção de leniência do Banco Central com as metas estimuladas pelo Conselho Monetário Nacional, uma política fiscal expansionista, que pressione a demanda agregada (...) ou a possibilidade de alteração das metas de inflação.”
A conclusão é cristalina: quando os investidores temem a irresponsabilidade fiscal e as autoridades começam a questionar o sistema de metas de inflação, isso eleva a incerteza. Mais incerteza eleva os prêmios de risco pedido por quem compra os papeis do Tesouro e financia o governo, impactando a curva de juros (quando o mercado precifica uma alta de juros para os contratos futuros) e pressiona o câmbio. O dólar mais alto, por sua vez, realimenta a inflação e pode retardar a queda de juros.
Assim, no cenário de um Banco Central independente e atento a seus deveres constitucionais, o recado não poderia ser mais claro: se for preciso, os juros vão subir para conduzir a inflação de volta à meta. Uma vitória de Pirro romperia os planos futuros do governo, confirmando a person
a non grata do presente.
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