Imagine uma realidade na qual o investidor só tivesse a oportunidade de acompanhar o preço de um único ativo para tomar suas decisões de investimento. Nessa situação hipotética em que os terminais da bloomberg só acessassem um ativo, um investidor experiente provavelmente optaria por acompanhar o comportamento dos juros de 10 anos do tesouro dos Estados Unidos, ou 10Y para os íntimos.
O 10Y provavelmente é o preço mais importante do mercado global, pois é a partir dele que deriva precificação de todos os outros ativos. Isso ocorre pois, devido à sua grande segurança e liquidez praticamente irrestrita, o 10Y é visto por muitos como a taxa de juros livre de risco do mundo, ou seja, o piso de rentabilidade que um investidor deve aceitar para ingressar em qualquer projeto.
Assim, ao calcular o retorno exigido para investir em qualquer ativo, o investidor deve partir dos juros do 10Y e adicionar um prêmio que considera o risco adicional de estar exposto a determinado país/setor/empresa. Como a precificação de todos os ativos partem do 10Y, quando este sofre variações, todos os outros ativos do mercado global são impactados.
Feita essa breve introdução, a razão pela qual escrevo este artigo é que o preço mais importante do mercado tem sofrido grandes variações. Partindo de níveis próximos a 3,6% no início de junho, o 10Y alcançou a marca de 4,22% nesta última terça-feira (15), o maior patamar dos últimos 15 anos.
As razões principais para a escalada recente estão associadas à performance da economia americana, que continua com sólido desempenho apesar de todo o esforço feito pelo Banco Central americano para desacelerar a atividade e controlar a inflação. O PIB do segundo trimestre surpreendeu o mercado com expansão de 2,4%; o mercado de trabalho segue gerando por volta de 200 mil novos postos por mês, nível que pressiona ainda mais a taxa de desemprego; e os dados de consumo tem vindo acima do esperado. Com tudo isso, a chance de que a economia caminhe para recessão, dada como líquida e certa há um tempo, vem diminuindo dramaticamente.
Como a cereja do bolo neste cenário de pressão no 10Y, veio o rebaixamento da nota de crédito do tesouro americano pela Fitch. A agência classificadora de risco revisou a nota de crédito do tesouro americano de AAA para AA+, como reflexo da trajetória crescente da dívida pública. Esse rebaixamento de rating não é inédito nos EUA e não indica nenhum cenário de ruptura, mas coloca ainda mais pressão nos juros americanos, que já vinham sendo impactados pelos fortes dados econômicos.
Os reflexos da escalada do 10Y nos mercados já são bastante claros. Aqui no Brasil, o dólar já voltou para o patamar próximo dos R$ 5, ante os R$ 4,70 que vinha negociando, em um movimento que foi semelhante frente a outras moedas globais. Os mercados acionários também já começam a sentir os reflexos dos juros mais altos lá fora, com performances erráticas no último mês.
O mundo com o 10Y em patamares elevados é um mundo de dólar forte e de um investidor mais avesso ao risco e essa é uma combinação tipicamente ruim para mercados emergentes como o nosso. O cenário atual requer cautela.
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