Na tentativa de reduzir o custo da máquina, cortando gastos com o funcionalismo, a equipe econômica do governo federal encaminhou ao Congresso, nesta quinta-feira (3), a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) da reforma administrativa. Porém, economistas capixabas criticam que o texto, apesar de trazer alguns avanços, mantém privilégios para a "elite" do serviço público.
O texto enviado deixou de fora parlamentares, magistrados e promotores. De acordo com o governo federal, esses são membros de poderes e, por isso, têm regras diferentes dos servidores comuns. A reforma também não valerá para militares, que seguem normas distintas.
De acordo com o governo, eventuais mudanças relacionadas a esses grupos de servidores precisariam ser propostas pelos próprios órgãos aos quais estão vinculados. Porém, é possível que o próprio Congresso Nacional use o pacote do governo para incluir, por conta própria, essas e outras alterações.
Para o economista e conselheiro do Conselho Regional de Economia do Espírito Santo (Corecon-ES) Vaner Corrêa, a reforma deveria ter uma abrangência bem maior do que está sendo proposto. "A exclusão de categorias alegando que são atividades típicas de Estado é um bofete na cara da sociedade brasileira e de suas demandas mais emergentes", afirma.
Já a economista e coordenadora cursos de graduação e MBA da Fucape Business School, Arilda Teixeira, avalia que, embora a criação do Regime Jurídico Único (RJU), que estabeleceu a contratação no serviço público por concurso, tenha trazido mudanças necessárias, acabou por criar distorções e vícios, criando uma "casta de cidadãos abonados", com vantagens por exemplo na estabilidade e aposentadoria.
"A reforma administrativa deveria ter uma abrangência bem maior do que está sendo proposto. A exclusão de categorias alegando que são atividades típicas de Estado é um bofete na cara da sociedade brasileira e de suas demandas mais emergentes.
A exclusão dos setores políticos, do Judiciário, do Tribunal de Contas e do Ministério Público, alegando que são salvaguardas da democracia, é algo ridículo e não combina com a modernidade das sociedades centrais e modernas.
A reforma nesta base, além de não criar nenhuma modernidade para as administrações públicas, também estabelecerá uma espécie de Casa Grande e Senzala [obra do sociólogo Gilberto Freyre, publicada em 1933, que discute a formação da sociedade], onde os funcionários do Executivo pertencerão perpetuamente à senzala e os outros sempre se protegerão dentro e nos arrabaldes da casa grande.
Nesta modelagem proposta, não será criado nenhum senso de modernidade e não haverá nenhuma redução de folha de pagamento. A reforma também não alterará o desequilíbrio que existe entre as remunerações, para as mesmas atividades, entre os servidores do poder público e privado, que atualmente há um fosso vergonhoso e avassalador.
Enquanto não se fizer uma reforma administrativa que enseje uma baita alteração na Constituição de 1988 e que toque em temas que hoje são tabus e totens, como é o caso da vitaliciedade, da necessidade do trânsito em julgado para demitir corruptos etc, a reforma vai atingir os que já levam o balaio nas costas há muito tempo."
A proposta para a reforma administrativa é a oportunidade que a sociedade brasileira tem para retirar de suas costas um elefante branco chamado Regime Jurídico Único (RJU), que o governo Sarney enfiou goela abaixo dos cidadãos contribuintes brasileiros, em troca de um 5º ano de mandato como presidente da República.
Numa prática recorrente do universo do presidente é dando que se recebe , todos aqueles que, naquele momento, estivessem trabalhando nas repartições públicas federais, após a aprovação do RJU, tornaram-se funcionários efetivos da União, com estabilidade de emprego e aposentadoria equivalente ao salário da ativa (Regime Próprio de Previdência Social RPPS). Formou-se aí uma casta de cidadãos abonados, em que boa parte nunca havia contribuído para o RPPS.
Mas o pacote de bondades não parou por aí. No balaio do Regime Jurídico Único foi inserido também o direito para militares (principalmente forças armadas) de deixar sua aposentadoria/pensão para filhas solteiras ou desquitadas (não havia o divórcio), ou para netos e netas (até completarem 18 anos, ou 21 se estiver cursando o ensino superior). Essa mágica, até hoje, sustenta descendentes de militares com benefícios muito acima do teto das aposentadorias do setor privado. E com um agravante, os aposentados do setor privado contribuíram durante 35 anos para terem direito ao salário de aposentadoria. Enquanto os servidores só passaram a contribuir a partir da adoção do RJU e se aposentaram na idade que a lei definiu para aposentadoria, sem ter contribuído o tempo que o setor privado é obrigado a cumprir.
A concepção do Regime Jurídico Único foi procedente. Estabeleceu que o ingresso no serviço público só poderia ser feito mediante aprovação em concurso público federal regra necessária para acabar com a anacrônica função da então Administração Pública Federal de ser cabide de emprego para parentes e amigos do governo arena para nepotismo e fisiologismo.
E por que agora é necessária uma reforma administrativa? Porque o RJU disseminou uma permissividade administrativa tal, que os vícios que ele pretendia eliminar foram gradativamente sendo reinstalados dentro do poder público, até chegarmos ao ponto que estamos hoje: o Regime Jurídico Único alimenta o anacronismo que pretendia eliminar.
Por quê? O RJU não foi uma boa escolha? Não.
Os agentes públicos é que não tiveram a integridade moral necessária para conduzir a Administração Pública como legítimos servidores aqueles que estão a serviço do Estado. A falta de integridade moral dos agentes públicos reverteu as posições. Colocou os cidadãos contribuintes a serviço do Estado. Isso tem que acabar.
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