O presidente Jair Bolsonaro já havia sido duramente repreendido por minimizar o coronavírus. Em pronunciamento na noite de terça-feira (24), em vez de dar voz à razão, resolveu seguir o caminho inverso e negar a ciência. O chefe do Executivo criticou as medidas de isolamento social, reprovou barreiras sanitárias, condenou o fechamento do comércio e questionou a suspensão de aulas. Em suma, o discurso contrariou todas as recomendações de pesquisadores e autoridades médicas para evitar o avanço da pandemia. Desrespeitou, inclusive, as orientações do próprio Ministério da Saúde.
Mais uma vez, Bolsonaro tachou a Covid-19 de “gripezinha” e que ela “brevemente passará”. Parece ignorar a curva epidemiológica da doença no Brasil, já anunciada diversas vezes pelo ministro Henrique Mandetta, que aponta que o número de infectados no país entra em abril em sua crescente e só começa a cair em agosto.
Os próximos meses são de luta, conforme alertado por fatos e especialistas, não por arautos do caos. “Teremos em torno de 20 semanas a partir do surto que serão extremamente duras para as pessoas”, disse o ministro da Saúde no dia 17.
Com um saldo, desde dezembro, de mais de 450 mil pessoas infectadas e mais de 20 mil mortes no mundo, o novo coronavírus é bem mais letal do que a gripe comum. Dezesseis vezes mais, em média, segundo cruzamento de dados da Universidade de Berna, na Suíça, e do Centro de Controle e Prevenção de Doenças, nos EUA.
Justamente no momento em que o Brasil entra na fase de transmissão comunitária, com números de casos dobrando a cada três dias, o presidente vai a público defender uma indefensável “volta à normalidade”. Experiências bem-sucedidas de combate à pandemia em todo o planeta demonstram exatamente o oposto.
“Tais mensagens podem dar a falsa impressão à população que as medidas de contenção social são inadequadas e que a Covid-19 é semelhante ao resfriado comum, esta sim uma doença com baixa letalidade”, disse a Sociedade Brasileira de Infectologia, em nota.
Mais de 50 países seguiram o exemplo e restringiram a circulação de pessoas. Rússia, Índia e Argentina são os casos recentes, totalizando mais de 2,3 bilhões de pessoas em isolamento. Nesta quarta-feira (25), ao lançar um programa de ajuda humanitária, a Organização Mundial da Saúde (OMS) voltou a reforçar a importância da quarentena. “Imploro aos líderes que se unam e prestem atenção a esse apelo”, disse o diretor-geral da entidade, Tedros Adhanom Ghebreyesus.
Ao questionar o fechamento de escolas, sob o argumento de que o grupo de risco é a população idosa, Bolsonaro mostra não entender minimamente as formas de contágio. Não à toa, os secretários estaduais de Saúde declararam-se “estarrecidos” com o pronunciamento do presidente e manifestaram adesão à cartilha do Ministério da Saúde, que até agora tem lidado de maneira técnica com a pandemia. “Não podemos permitir o dissenso e a dubiedade de condução do enfrentamento à Covid-19”, diz trecho do documento.
Para enfrentar qualquer obstáculo, um país precisa de dados, planejamento e gestão. Para combater um inimigo desconhecido como o Coronavírus, que já causou 57 mortes no Brasil e deixa seu rastro de destruição também na economia, é preciso ainda mais. Em meio aos argumentos insustentáveis apresentados por Bolsonaro no pronunciamento, uma afirmação se salva, aquela em que o próprio presidente apresenta os ingredientes que faltam para o êxito nesta batalha: “É essencial que o equilíbrio e a verdade prevaleçam.”
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