A aprovação da criação de 778 cargos efetivos na estrutura do Ministério Público do Espírito Santo (MPES) pela Assembleia Legislativa é como um daqueles filmes de grandes franquias que para serem compreendidos exigem que o espectador tenha assistido às produções anteriores.
O Projeto de Lei 555/2023, que criou os cargos, é uma nítida reação à Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) em votação no Supremo Tribunal Federal (STF) que já formou maioria contrária à legislação que, em 2019, criou 307 cargos comissionados no MPES. Isso porque sete ministros já defenderam o entendimento de que esse número de cargos de livre nomeação e exoneração é desproporcional ao de efetivos do órgão. Inconstitucional, portanto.
Ao criar os 778 cargos efetivos, portanto, a proporção exigida pela lei é atingida. Atualmente, há 512 cargos comissionados e 517 efetivos no órgão. Mas havia outra forma de se chegar à legalidade sem aumentar o gasto: reduzindo os cargos comissionados. Em 2019, quando as 307 vagas foram criadas, a aprovação na Assembleia também foi sem resistências, mas igualmente provocou reação da opinião pública.
O cidadão tem o direito de questionar essa decisão, que terá impacto anual de R$ 9.112.904,87 em 2023, com acréscimo de 2,4% nos gastos com pessoal do Ministério Público. O órgão deveria se posicionar com mais transparência sobre as intenções da criação de um número tão expressivo de cargos efetivos, em um debate amplo com a sociedade que o próprio Ministério Público deveria proteger. Mas, como já foi dito, a aprovação do projeto foi ligeira, sem tempo para qualquer debate público. E rapidamente recebeu a sanção do governador Renato Casagrande.
Impressiona mais uma vez a capacidade de mobilização política quando há interesse do próprio poder público. Tanto o Projeto de Lei 555/2023, que criou as vagas, quanto o Projeto de Lei Complementar 32/2023, que prevê alterações na Lei Orgânica do MPES, no estatuto e no Fundo Estadual do Ministério Público, ambos de autoria da procuradora-geral de Justiça, foram protocolados na segunda-feira (26), pouco após o meio-dia na Assembleia. No mesmo dia estavam aprovados com ampla maioria. E em menos de 48 horas assinados pelo governador.
O poder público demora a reagir às urgências da vida em sociedade, não consegue formar consensos com a agilidade que a população precisa nas pautas que a afetam diretamente, sendo que os acontecimentos mais recentes na Grande Vitória mostram que a segurança pública é uma dessas prioridades incontestáveis. Mas a capacidade de organização e alinhamento dos Poderes só dá as caras quando há conveniência.
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