A liberdade de expressão não para de ser distorcida para justificar ataques deliberados aos princípios que são a seiva da democracia, mas, como toda falácia, não há sustentação para tanto. É mero engodo embalado como argumento. As intimidações que culminaram no bombardeio com fogos de artifício ao prédio do Supremo no último sábado (13) são criminosas e tiveram reação à altura, com a prisão dos responsáveis.
Não há liberdade de expressão contestada, há crime. Com a necessidade de dar peso aos atos diante do recrudescimento da militância extremista, a mais alta esfera da Justiça brasileira se impõe simplesmente por fazer cumprir o seu papel institucional. Indiscutível.
Após a prisão de Sara Geromini, vulgo Winter, o perfil da militante bolsonarista no Twitter lançou mão de mais um embuste: "Apoiar o presidente da República, Jair Bolsonaro, é crime". O método da desinformação está explícito, pela dedução mais simples. Parte-se do pressuposto de que a cabeça do movimento conhecido como "300 do Brasil" está presa por ter uma posição política, quando o que está sendo colocado em questão são suas articulações criminosas para desqualificar a democracia através de ataques ordenados às instituições, com o STF e o Congresso em destaque.
Mais uma vez, a liberdade de expressão permanece intocada no seu panteão. Ela não está em questão. Os possíveis crimes dessa turba de "instigados e incentivados", como bem pontuou a ministra Cármen Lúcia, sim.
Nas manifestações antidemocráticas, em meio aos já corriqueiros cartazes pedindo intervenção militar, passou a figurar também um novo absurdo: "Fake news não é crime". Apoiam-se no fato de que não se trata ainda de um crime tipificado pelo Código Penal para minimizar o impacto nefasto da mentira potencializada pelo meio digital na vida em sociedade.
A sistematização da desinformação é, sim, ferramenta para a prática de crimes como o ataque às instituições, a calúnia e a difamação. Criam-se falsos debates e, no fim das contas, é a democracia que sai abatida. As fake news criam hologramas de realidade que direcionam a opinião pública para o caminho que desejam. Manipulação pura e simples.
Também persistem as comparações absurdas. Apoiadores de Bolsonaro tendem a afirmar, orgulhosos, que não há casos de corrupção neste governo. Para eles, essa deveria ser a preocupação do Supremo. De forma alguma este jornal discorda dos malefícios causados pela pilhagem sistemática do Estado e da necessária condenação dos administradores públicos que a praticam, como a ação deslanchada pela Lava Jato durante os governos Dilma e Temer. Mas um crime não anula o outro, tampouco há escalas de valor. Malfeitos, com envolvimento de apoiadores ou de membros do próprio governo, devem ser investigados com o mesmo rigor. Não é um jogo de quem errou mais, mas de quem simplesmente errou.
As tentativas organizadas de aniquilamento das instituições democráticas são uma ameaça ao Estado democrático de Direito, que torna possível a convivência em sociedade com base nas leis. É esse regramento, estabelecido por consensos, que coloca o ponto final nas divergências, não o autoritarismo de grupos que tentam se sobrepor à força.
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O Supremo está votando a validade do inquérito das fake news, que acabou se tornando controverso por ter sido aberto de ofício. A decisão dos ministros não muda, contudo, a urgência de se desvendar esse submundo no qual a mentira se camufla de verdade para ditar as regras. Operadores, financiadores... tudo precisa ser apurado.
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