No dicionário, “milagre” é um acontecimento extraordinário, sem explicação, que pode ser atribuído a um ser todo-poderoso. O que o Brasil espera do presidente da República diante da pandemia do coronavírus não é, portanto, uma graça divina, mas seu exato oposto. O país cobra atitudes concretas e objetivas do chefe do Executivo, baseadas em fatos e evidências científicas, articuladas com os entes da federação para atender o povo nas mais diversas dimensões da crise.
No dia em que a letalidade do vírus bateu novo recorde no Brasil, Jair Bolsonaro desdenhou dos 474 mortos com um crudelíssimo “e daí?”. No Espírito Santo, o recorde se repetiu, com 14 óbitos, Esse dar de ombros do presidente tem sido seu modus operandi diante da crise, desde que ela era apenas anunciada. Quando a nação se aproxima da fase mais grave da pandemia, ratificando as previsões da ciência, essa postura negligente do principal representante público do país é ainda mais condenável.
Faltam testes, faltam equipamentos de proteção aos profissionais de saúde, faltam respiradores, faltam até vagas em cemitérios. O sistema de saúde entra em colapso em vários Estados, antes mesmo do pico da pandemia. Sobre esses assuntos, nenhuma palavra. “Eu não falo sobre a questão da saúde”, esquivou-se o presidente, quando o Brasil registra mais de cinco mil mortos, tornando-se o 9º país com mais vítimas, acima da China, sem levar em conta as subnotificações.
Embora o discurso de Bolsonaro seja eivado de viés absolutista, ao intitular-se “chefe supremo”, o presidente não hesita em transferir para governadores e prefeitos todo o peso - político, econômico e sanitário - da adoção de medidas firmes para combater a pandemia. Na manhã desta quarta-feira (29), ao ser questionado novamente sobre a escalada de mortes, repassou o débito para Estados e municípios. “Eles têm que responder. Vocês não vão colocar no meu colo essa conta”, disse, ignorando projeções que desenhavam quase um milhão de mortos no país se nada tivesse sido feito.
Diante da perigosa queda na taxa de isolamento, o presidente deve liderar a batalha contra o coronavírus, e não entabular uma guerra política atrás de outra, em um diversionismo que desvia o país das decisões necessárias e urgentes. Bolsonaro tem Messias no nome, mas não concentra poderes nem opera feitos sobrenaturais. Ninguém duvida da complexidade da sua missão, mas ela não tem nada de mítica. Basta agir como o homem investido da faixa presidencial e honrar seus compromissos políticos.
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