Foram necessários pouco mais de três meses para que o Brasil registrasse 500 mil contaminados pelo novo coronavírus, mas apenas 19 dias para que duplicasse os diagnósticos positivos e batesse a marca de um milhão de casos da doença. Enquanto boa parte do mundo já lida com a segunda onda, o país ainda enfrenta um renitente tsunami, com saldos frequentes de mais de mil mortes diárias.
Todos os países atingidos tiveram que encarar os impactos de uma doença desconhecida, altamente contagiosa. O Brasil, no entanto, em piada já corrente, somou a pandemia ao pandemônio, com caos político e medidas claudicantes. A única ação eficaz virou queda de braço político, o que fez com que o isolamento social nunca fosse adotado a contento, enquanto um remédio sem qualquer comprovação científica virou panaceia. Dissiparam-se o comprometimento e a seriedade cruciais para a batalha.
A contribuição do presidente Jair Bolsonaro para o fracasso é inegável. Desde o início, o mandatário deixou claro seu menosprezo pela “gripezinha”. Quando o Brasil registrou 300 óbitos em um dia, disse que não era coveiro. Quando o país superou a China, batendo mais de cinco mil mortos, deu de ombros com um “e daí?”. Quando ficou impossível negar o inegável, maquiou dados.
A noção de que o Planalto patina na contenção da Covid-19 foi medida no recém-divulgado Índice de Percepção da Democracia. Na avaliação da população sobre respostas do governo, 60% dos brasileiros afirmaram que o Brasil não fez o suficiente para restringir a circulação de pessoas. Na análise geral sobre as ações, apenas 34% acreditam que o governo de Jair Bolsonaro está lidando bem com a pandemia. É a pior avaliação mundial.
Há mais de um mês, o Brasil encara a pandemia com um ministro da Saúde interino. Segundo país com mais contaminados, ocupa a 114ª posição em número de testes por milhão de habitantes. Sem testes, não tem um retrato fiel do avanço da doença. Com a subnotificação e sem quarentena, não há como mensurar o pico, não dá para calcular a duração do platô nem quando chegará o “novo normal”.
Na esfera econômica, repete-se a claudicância das ações. A primeira parcela do socorro a Estados e municípios só foi depositada há poucos dias. Milhões de informais e MEIs não receberam até hoje o auxílio emergencial a que têm direito, enquanto servidores, empresários, militares e até foragidos da Justiça tiveram acesso indevido ao benefício.
Ao ser cobrado, Bolsonaro esquiva-se com uma falácia. Transfere a responsabilidade para governadores e prefeitos, escudando-se na decisão do STF que reconheceu a autonomia dos Executivos locais para adotar medidas condizentes com suas realidades. A Corte nada mais fez do que reconhecer o óbvio constitucional, que o Brasil é uma federação, não um reino. Em nenhum momento eximiu o presidente da República de seus deveres. Bolsonaro tem um milhão de motivos para obedecer a liturgia do alto cargo que ocupa.
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