De quantas décadas perdidas um país precisa para se reerguer? O desmoronamento do PIB brasileiro com a pandemia em 2020, consequência de uma conjuntura mundialmente desfavorável em primeiro plano, mas com o pano de fundo dos subsequentes erros e omissões internos, reforça a tragédia brasileira neste ciclo mais recente.
A confirmação da queda de 4,1%, mesmo que abaixo de projeções ainda mais pessimistas de distintos atores econômicos, veio selar o que já era esperado. Se os anos 80 foram a década perdida, confirma-se agora que os anos 2010 foram a década sem rumo. E ainda sem perspectiva de melhora.
O tombo de 2020 foi a maior contração do PIB desde o início da série histórica com a metodologia atual do IBGE, em 1996. Avançando mais no tempo, até 1901, a queda do ano pandêmico foi a terceira pior já registrada, ficando atrás de 1990 (-4,35%), no primeiro ano do governo Collor, e 1981 (-4,25%), durante o governo Figueiredo.
O retrato de 2020 é pavoroso, sobretudo pela leniência do governo Bolsonaro, que conseguiu acumular derrotas sociais e econômicas em duas frentes: além do negacionismo e da consequente falta de gestão no enfrentamento da crise sanitária que descamba agora para o seu agravamento, tampouco foi capaz de pavimentar o caminho do crescimento econômico com as reformas. O enxugamento do Estado brasileiro foi atropelado pelo oportunismo populista.
Mas é preciso fazer justiça: Bolsonaro não é o pai da nova década perdida, apenas o seu coroador. Desde que a "marolinha" da crise de 2008 desaguou em um tsunami de gastos no Brasil, no início do primeiro mandato de Dilma Rousseff, já se prenunciava a catástrofe econômica. "Gasto público é vida" virou um mantra, refletindo de forma simplória a malfadada nova matriz econômica que, na metade da década, afundou o país na recessão.
Com o impeachment e a chegada de Michel Temer ao poder, o equilíbrio fiscal passou a guiar as ações governamentais. A aprovação do teto de gastos foi um compromisso com a racionalidade orçamentária, e algumas reformas, como a trabalhista, saíram do papel. O resultado foi animador, rendendo um curto ciclo de crescimento a partir de 2017 que avançou até o primeiro ano de mandato do atual governo, em 2019. Mas o fôlego parece ter acabado antes mesmo da pandemia.
E o resultado de 2020 arranca o Brasil de um ranking que ostentava havia 14 anos. Desde 2006, o país passeava por posições entre as 10 maiores economias do mundo. Foi arremessado agora para a 12ª posição, cedendo lugar para Canadá e Coreia e ainda ficando atrás da Rússia, em 11º. É lastimável, mas o Brasil continua sendo o país de um futuro que nunca chega, amarrado a retóricas políticas e econômicas do atraso. A perspectiva é de que, em breve, Espanha e Itália também deixem o país para trás.
Uma nação que não produz riqueza é também uma nação com déficit social crônico, impedindo a prosperidade de seu povo. O PIB é mais que um número em uma planilha, indicando a produção de bens e serviços no país ao longo de trimestres ou anos, é um retrato do sucesso ou do fracasso de uma sociedade. Traduz-se em renda e qualidade de vida.
Nenhum avanço social é possível sem crescimento econômico pleno. As projeções para 2021 não são as mais otimistas, nesta década que se inaugura. O Brasil acumulou perdas demais em sua história recente; o que não pode mais perder é tempo.
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