Por várias vezes ao longo de sua história, sempre que as contas públicas caíam em uma enrascada, o paliativo adotado pelo Brasil sempre foi aumentar a carga tributária. Mas essa é uma porta falsa, que leva a um beco sem saída. Em primeiro lugar porque a cada aumento de gastos que comprometa o equilíbrio fiscal será necessário um novo round de aumento de impostos. Em segundo porque esse movimento asfixia cada vez mais contribuintes e setores econômicos, matando o potencial de crescimento do país. Já passou da hora de abandonar medidas protelatórias e atacar os problemas reais, vencendo resistências às urgentes reformas tributária e administrativa.
Além de racionalizar o emaranhado de impostos, hoje na casa dos 35% do PIB e poço sem fundo de burocracia e insegurança jurídica, é preciso encarar com lucidez os números amazônicos do funcionalismo público, segundo item que mais consome o orçamento federal. Privilégios da nata do funcionalismo, rendimentos acima da média do mercado de trabalho e uma estabilidade irrestrita e desatrelada de qualquer cláusula de rendimento são incompatíveis com a realidade brasileira. Isso em todas as esferas do Poder.
Auditoria do Tribunal de Contas da União (TCU) feita no ano passado apontou que 86% dos postos em empresas estatais pagam rendimentos superiores a cargos semelhantes no setor privado. Em 43% dos casos, a remuneração nas estatais é mais do que o dobro do salário dos celetistas. Levantamento inédito do próprio governo federal mostrou que a média dos vencimentos nas estatais brasileiras é de até R$ 31,3 mil, deixando fora do cálculo as diretorias executivas, que chegam a ganhar até R$ 2,9 milhões por ano, em média. Em 2019, a renda média do brasileiro ficou abaixo de R$ 2,5 mil. Para piorar o quadro, 18 empresas geridas pelo Estado precisaram de aporte do Tesouro Nacional, somando R$ 17 bilhões.
Os números dão argumentos fortes para a privatização e para uma revisão profunda da estrutura administrativa pública, que inclua as castas do funcionalismo e reveja as regras de estabilidade, limitando o benefício a cargos de Estado, por exemplo. Em entrevista à colunista Beatriz Seixas, a ex-secretária do Tesouro Nacional e atual economista-chefe do Santander Ana Paula Vescovi, referência em contas públicas, defendeu a demissão por insuficiência de desempenho no serviço público. “Tenho certeza que esse ajuste de regras será suficiente para nem precisarmos demitir, porque isso vai implicar numa revolução na produtividade do serviço público”, pontuou.
Com o necessário aporte de recursos da ordem de R$ 600 bilhões para combater a pandemia do novo coronavírus, o que exigiu repasses à área da saúde, ao auxílio emergencial e a programas de crédito, por exemplo, a saúde financeira brasileira, que já não era boa, está agora na UTI. A dívida pública deve saltar para mais de 100% do PIB neste ano, com projeção de trajetória ascendente até, pelo menos, 2025. A posição desconfortável coloca o país como campeão em déficit entre os países emergentes, em relatório do Instituto de Finanças Internacionais.
O problema não está restrito a Brasília. Pelo contrário. Com a crise econômica decorrente da pandemia, o cenário é de queda de arrecadação e de empobrecimento da população, que se tornará mais dependente de serviços públicos. Governos, em todos os níveis, terão que fazer mais com menos. Os mecanismos são obviamente mais complexos, mas as linhas gerais da solução seguem as mesmas de um orçamento doméstico: cortar supérfluos, diminuir despesas, investir com inteligência.
Um primeiro e importante passo foi dado com a aprovação da reforma da Previdência, principal fonte de gastos das administração pública. Agora, é incontornável rever os gastos com a folha, que têm especial peso nas finanças de Estados e municípios. É preciso dar transparência aos números e clareza ao discurso para avançar na reforma administrativa, que o que tem de impopular tem também de urgente.
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