Há 20 anos, familiares e amigos de Isabela Negri Cassani enterraram o corpo da adolescente, estuprada e morta exatamente em um 24 de outubro como este. Nesta quinta-feira, é o Espírito Santo que pode sepultar o inquérito que apurava o assassinato da menina de apenas 15 anos. Mesmo após mais de 50 exames de DNA e dez delegados, a saga por justiça deve chegar ao fim com a prescrição do crime, sem nenhum suspeito indiciado.
A morte brutal de Isabela deixa algumas lições dolorosas para o Brasil em seu caminho para frear a impunidade, sem dúvida um dos combustíveis da violência e da corrupção. Se não é possível dizer que o Estado foi omisso diante da tragédia, já que a investigação continuou até o último minuto, também não se pode ignorar as pontas soltas que podem ter livrado o culpado - ou os culpados, nunca se saberá - da justa punição.
O último delegado a presidir o inquérito, e que não poupou esforços para chegar ao autor, foi enfático ao reconhecer as falhas procedurais, que nada têm a ver com tecnologias obsoletas. “Esqueceram de fazer o óbvio”, disse José Lopes, chefe do Departamento Especializado em Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP), sobre descuidos imperdoáveis da polícia, como não refazer o trajeto da vítima na noite em que foi espancada, estuprada e morta.
Além do mistério em torno do assassinato de Isabela, o caso levanta outro enigma da Justiça brasileira: um sistema de prescrição de pena que não encontra par em nenhum lugar do mundo, não por seus méritos, mas por suas brechas. Crimes graves ficam sem punição devido a regras complacentes, com um sem-número de hipóteses de prescrição e possibilidades de se chegar até ela, mediante o abuso do direito de defesa.
Entre as manobras possíveis está lançar mão de recursos infindáveis ao STJ e ao STF, como mandados de segurança e habeas corpus, com o simples objetivo de postergar o trânsito em julgado até a prescrição. Ou quando, diante da sentença final, o réu foge para outro país e a contagem do prazo de prescrição continua a contar, enquanto em outros países ela é suspensa. “É como beneficiar alguém por sua torpeza”, cravou o doutor em Direito Américo Bedê Freire Júnior, no quadro Me Explica Direito, da CBN Vitória.
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O problema, o advogado complementa, não é a existência da prescrição, mas a legislação leniente. Uma impunibilidade garantida por lei se transforma em uma impunidade conquistada pelo réu. Como tantos avanços indispensáveis ao país, a reforma processual penal tramita a um ritmo paquidérmico no Congresso Nacional. Quantas Isabelas continuarão a morrer sem que seus algozes sejam punidos antes que o Brasil mude?
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