Petrópolis é um município da região serrana do Rio de Janeiro historicamente castigado pelas chuvas, mas o que se viu nesta terça-feira (15) foi uma devastação, no dia em que mais choveu na cidade nos últimos 90 anos. Os temporais no país têm provocado estragos e mortes, inclusive no Espírito Santo, com tanta recorrência que passam a sensação de um filme que não para de ser reprisado. No interior do Estado, duas pessoas morreram nesta quarta-feira (16), em Alegre e Nova Venécia. Vítimas, como na cidade do Rio de Janeiro, da intensidade das chuvas. Uma tragédia que não pode ser atribuída somente à natureza, por exigir uma melhor atuação do poder público na gestão das cidades.
A força das águas em Petrópolis foi impressionante, ficando expressa nos vídeos das enxurradas e dos deslizamentos e também nas imagens de dezenas de veículos, inclusive de grande porte, arrastados e amontoados. As cenas de Petrópolis tiveram um impacto de um cataclisma. Como, dadas as devidas proporções, o temporal de Iconha, em janeiro de 2020.
Na noite desta quarta, o Corpo de Bombeiros em Petrópolis contabilizava mais de 90 mortes, sendo impossível ainda precisar o total de perdas humanas. Muitos moradores ainda estavam desaparecidos. Apenas em uma rua da região central da cidade, foram encontrados 12 corpos, um massacre.
Tragédias provocadas pelas chuvas intensas desde o fim do ano passado têm sido registradas em Minas, que ainda sofre com as inundações em quase metade dos municípios do Estado, e na Bahia. O Espírito Santo tampouco tem passado incólume, com o registro de chuvas intensas e alagamentos na Grande Vitória e no interior neste mês de fevereiro.
Em Petrópolis, o volume de chuva atingiu um patamar inédito, e o acumulado pluvial, ao registrar 260 mm, superou a média histórica do mês de fevereiro, que é de 240 mm. Cientistas e especialistas avaliam que eventos climáticos extremos como esse não podem mais ser considerados pontos fora da curva. Não há espaço, portanto, para se apegar ao imponderável, diante da imprevisibilidade da natureza. As responsabilidades do poder público aumentam, com a incumbência de prover mais segurança a quem vive nas cidades.
As tragédias resultam do impacto do fenômeno natural sobre as ocupações humanas. Como no Brasil as cidades cresceram de forma desordenada, avançando sobre as margens de rios e se alastrando pelas encostas, os riscos estão sempre presentes. Mas é possível mitigá-los. Em Petrópolis, uma cidade montanhosa atravessada por um rio, foi adotado um sistema de alto-falantes após a tragédia que em 2011 matou mais de 900 pessoas na região serrana do Rio, afetando também cidades como Nova Friburgo e Teresópolis. Sistema importante para as emergências, mas ainda um paliativo.
Sabe-se que os investimentos públicos estão cada vez mais escassos, mas é preciso encontrar formas de viabilizá-los para a promoção de mudanças mais estruturais em áreas de risco. Um reordenamento urbano que garanta mais proteção às moradias diante de mudanças climáticas que vão causar cada vez mais eventos extremos. Um tratamento mais adequado dos leitos de rios e das encostas, com engenharia avançada. Não é tarefa fácil em um país de tantas crises, mas precisa se encaminhar como um projeto sério, encabeçado pela própria sociedade civil.
A reponsabilidade é universal. A gestão ambiental passa pela administração pública, mas também envolve o setor empresarial e industrial, para que seus processos produtivos estejam sempre de acordo com as boas práticas de preservação do meio ambiente. E o próprio cidadão tem seu quinhão, com a urgência de mudar a própria mentalidade sobre a gestão do lixo que produz. Jogados nas ruas e nos rios, eles também contribuem para os alagamentos.
A ocorrência de fenômenos climáticos mais devastadores já deixou de ser um alerta para o futuro, as tragédias tão recorrentes estão longe de ser mero alarmismo. Já são uma realidade, e as cidades brasileiras ainda não estão minimamente preparadas para resistir a esse impacto. E já não dá mais para dizer que é falta de aviso. É falta de ação.
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