O senador da República Flávio Bolsonaro tem razão quando diz que o jogo é bruto. Não é para ser mesmo moleza. Deveria saber desde que entrou na vida pública que não se alcança a posição na qual agora se encontra, na elite legislativa do país, sem o devido e constante escrutínio. Mais visada ainda é a situação do seu pai, eleito democraticamente presidente da República e, consequentemente, carregando o que pode ser considerado um fardo para alguns: a obrigação de prestar contas de todos os seus atos. A família Bolsonaro chegou ao Palácio do Planalto, mas não se tornou por isso a realeza intocável do país, em moldes absolutistas.
Não sem razão, há muito a ser explicado com a prisão de Fabrício Queiroz, ex-assessor do senador quando ele era ainda deputado estadual, na casa do advogado do clã Bolsonaro, em Atibaia. O presidente, em sua live das quintas-feiras, fez por menos. Afirmou não ser advogado de Queiroz, mas soube exercer bem esse papel em suas poucas justificativas. Limitou-se a reclamar que a ação foi "espetaculosa".
Enquanto isso, a presença de Queiroz por mais de um ano no imóvel do escritório de advocacia de Frederick Wassef, que nesta semana mesmo marcou presença na cerimônia de posse do ministro das Comunicações no Planalto, não foi nem sequer mencionada por Bolsonaro. É definitivamente o esclarecimento que o país aguarda. O apelido de Wassef, entre os Bolsonaro, é "anjo", e a proximidade com ele não é segredo.
É inexplicável que o presidente não perceba a arapuca na qual ele mesmo se coloca. Ao reclamar que "parecia que estavam prendendo o maior bandido da Terra", Bolsonaro trai aquela que foi a sua maior bandeira de campanha: o combate à corrupção.
Fabrício Queiroz é suspeito de ser o operador de um esquema de rachadinha no gabinete de Flávio Bolsonaro na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj). Típico escândalo de baixo clero, que aqui no Espírito Santo é conhecido como "rachid": ocorre quando parte dos salários de funcionários, inclusive fantasmas, são embolsados pelo parlamentar. No universo da corrupção, é um roubo no varejo, não no atacado, como os casos da Lava Jato. Mas minimizar qualquer que seja o ataque aos cofres públicos é hipocrisia inaceitável por parte de um presidente que se diz incorruptível.
Seu papel, neste momento, não é atiçar os ânimos conspiratórios, mas apoiar as investigações. Afinal, a crise envolvendo seu filho e Queiroz instalou-se definitivamente no Planalto nesta quinta-feira (18), e a única atitude republicana possível é deixar a Justiça agir.
A investigação, que já dura dois anos, envolve o filho do presidente em possíveis crimes de organização criminosa, peculato (desvio de recursos públicos) e lavagem de dinheiro. Qualquer tentativa de blindagem, a esta altura, abalará mais ainda um governo que já não anda bem das pernas.
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O "anjo", apelido que batizou a operação que levou à prisão de Queiroz, passou a ser o inferno do presidente neste momento, por conectá-lo diretamente à investigação de desvios de recursos na Alerj. Bolsonaro também pode recorrer ao "eu não sabia de nada", recurso sempre à mão, usado por outro presidente da República. Aquele mesmo tão ligado a Atibaia. Por essas e outras, o jogo deve mesmo ser bruto para todos suspeitos de envolvimento em ilícitos, mesmo que indiretamente.
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