Desde que o contágio e as mortes por coronavírus começaram a subir exponencialmente, a Organização Mundial da Saúde (OMS) tem sido enfática em defender que a testagem em massa é uma das medidas mais eficazes para combater o avanço da doença. O motivo é simples, explicado por uma metáfora certeira: “Não se consegue combater um incêndio com os olhos vendados”, disse o diretor-geral da entidade, Tedros Adhanom Ghebreyesus. Mas, a despeito da lógica, o Brasil tem agido às cegas.
O Ministério da Saúde admite que faltam kits para testes no país e, por isso, mantém uma política de só realizá-los em suspeitos com quadro grave, sob a alegação de economizar recursos. A medida não apenas contraria a ciência, como também a experiência. Os países que conseguiram frear o avanço da pandemia foram justamente aqueles que investiram nos diagnósticos rápidos de todos os casos suspeitos, mesmo os assintomáticos.
A Coreia do Sul é um exemplo de que os testes em massa são uma arma valiosa. O país começou a registrar as primeiras ocorrências ao mesmo tempo em que a Itália, que não adotou o diagnóstico intensivo. Os números falam por si: enquanto a nação asiática teve pouco mais de 8 mil contaminados e 84 mortes, o país europeu tornou-se o novo epicentro da doença, com mais de 33 mil infectados e 2.978 fatalidades.
Até agora, o governo federal usou cerca de quatro mil testes e tem à disposição no SUS outros 26 mil, números que estão bem distantes do ideal. Para se ter uma ideia, a Coreia do Sul, com o equivalente a um quarto da população brasileira, realiza mais de 15 mil exames por dia, desde o início da transmissão.
Além da pouca quantidade de kits, é grave também a demora nos resultados. O caso do primeiro morto por coronavírus no Brasil é emblemático. O porteiro de São Paulo, de 62 anos, faleceu antes do diagnóstico da doença e, 24 horas após sua morte, nenhum dos parentes haviam sido testados, mesmo apresentando sintomas.
No Espírito Santo, outro exemplo de letargia. Dois dos oito casos de Covid-19 são de um casal que retornou ao Estado na quinta-feira (12), já com sintomas, após um cruzeiro no Caribe. A confirmação, no entanto, só veio na última terça-feira (17), cinco dias após a realização do teste. Outras 32 pessoas que também voltaram da viagem ainda aguardam o diagnóstico. Enquanto isso, outros países submetem suspeitos a testes que demoram 15 minutos para revelar a presença do vírus.
Essa falta de rigor nos diagnósticos leva à subnotificação dos casos, que por sua vez desemboca na frouxidão do controle epidemiológico. Se não for solucionado, esse descompasso entre a realidade e o imperativo científico para contenção da doença pode custar caro ao Brasil.
O Ministério da Saúde já anunciou que pretende comprar mais kits de testes - serão 40 mil entregues pela Fiocruz até abril, número ainda tímido. Apenas com dados precisos é possível ter um retrato fiel da disseminação do Covid-19 e, assim, tomar as medidas necessárias. Não conhecer o inimigo torna mais difícil vencê-lo.
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