Há uma semana, quatro jovens foram brutalmente assassinados em uma emboscada na na ilha Doutor Américo de Oliveira, localizada entre Vitória e Cariacica. Mas o terror daquela chacina lamentavelmente não foi um evento isolado neste difícil ano para a segurança pública capixaba. Neste domingo (04), à luz do dia, um carro com cinco ocupantes foi atingido por dezenas de tiros, no Centro de Vitória, deixando dois mortos e dois baleados. Com a assustadora estatística de setembro, com 95 mortes violentas até o dia 28, a expectativa das próprias autoridades é de que 2020 se encerre com mais de mil homicídios, abandonando, assim, a marca histórica de 2019.
No ano passado foram 978 mortes violentas no Espírito Santo. Até o último dia 28, os registros já davam conta de 828 homicídios.
Tentar entender o que mudou em 2020 não é tarefa simples. A troca de comando na Secretaria de Segurança Pública do Espírito Santo, efetivada em 6 de abril, deu-se justamente pela disparada no homicídios em março, ainda no início da fase em que o isolamento social foi mais rigoroso na pandemia. Naquele mês, foram 143 assassinatos, número 66,27% maior do que o mesmo período de 2019. No domingo anterior à demissão de Roberto Sá, foram 13 mortes violentas, configurando-se no dia com maior número de registros desde a greve da PM de 2017.
O coronel da PM Alexandre Ofranti Ramalho assumiu imediatamente o posto. Já no dia 13 de abril, uma operação da Polícia Militar em todo o Espírito Santo para combater os homicídios e o tráfico de drogas durante o feriado conduziu 299 pessoas a delegacias. As operações policiais não cessaram, e nos meses seguintes conseguiu-se frear a escalada dos homicídios. Mas a tendência não se manteve no segundo semestre.
Na segunda quinzena de julho, foram registrados quatro ataques a ônibus na Grande Vitória. Dois deles em menos de 24 horas. Em uma das ações incendiárias, os criminosos deixaram um bilhete, escrito à mão, no qual avisavam que se tratava de uma represália ao Estado em função da suspensão das visitas nos presídios desde março, medida tomada para conter a disseminação da Covid-19 entre os presos. E ainda uma resposta pelas condições das prisões.
Mesmo que o nível de orquestração desses atos violentos possam ser questionados, o episódio pode dar algumas pistas para entender o crescimento no número de homicídios, na forma de reação ao aparelho repressivo do Estado. De janeiro a agosto de 2020 foram realizadas 700 operações policiais somente na região do Bairro da Penha, em Vitória, considerado atualmente o epicentro da criminalidade, com 48 delas resultando em confrontos armados. No Espírito Santo, até agosto, 1.140 homicidas tinham sido presos, com 2.603 armas apreendidas.
Fica muito evidente que é uma guerra que só será vencida com a mobilização do aparato de inteligência, que se antecipe às movimentações dessas organizações criminosas que disputam poder na Grande Vitória. O maior desafio, em meio a esse número considerável de prisões, e impedir a reorganização das cúpulas criminosas, com sucessões rápidas. Lideranças encarceradas precisam ser encaminhadas para presídios federais, para cortar o vínculo com os comandados nos bairros.
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2020 não deve terminar com boas notícias, ao que tudo indica. Mas deve ser um ano estudado, desde já, meticulosamente pelas autoridades de segurança pública estaduais. É um diagnóstico necessário para se reverter esse quadro e continuar na trajetória de redução de homicídios que se testemunhou nesta década. Um marco que tirou um estigma do Espírito Santo.
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