Cercadas de ineditismos, as eleições municipais de 2020 põem em alerta os mais diversos setores da sociedade. O primeiro e mais óbvio motivo é a segurança sanitária, mas a pandemia do novo coronavírus, somada a novas regras e velhos problemas, traz importantes desdobramentos para os quais o Brasil não está plenamente preparado. Outro tipo de disseminação, não a do vírus, mas a de notícias falsas, levanta especial preocupação quanto ao desequilíbrio do jogo democrático nestes tempos movediços.
Com a impossibilidade de manter os tradicionais comícios e corpo a corpo com os eleitores, devido ao distanciamento social, as redes sociais ganham ainda mais peso neste ano. Para sete partidos do Espírito Santo, o desafio é ainda maior, já que estarão fora da propaganda na TV e no rádio, atendendo às normas estipuladas pela minirreforma eleitoral, que entram em vigor neste pleito. As redes sociais serão o grande campo de batalha, e a Justiça Eleitoral tem obstáculos redobrados na missão de impedir uma guerrilha virtual sem limites, que interfira no debate plural, na paridade entre os candidatos e na soberania das urnas.
Campanhas de desinformação nos pleitos não são novidade, mas foram amplificadas por duas características do mundo digital: agilidade e onipresença. Nem mesmo democracias consolidadas estão imunes, como provaram os escândalos da Cambridge Analytica e da russa Internet Research Agency na manipulação de eleitores nos EUA.
A última corrida presidencial no Brasil também deixou claro que, além de palanque digital, o potencial da internet tem sido desvirtuado com ataques cibernéticos, perfis falsos e disparos em massa de fake news. Quatro das oito ações no TSE que pedem a cassação da chapa Bolsonaro – Mourão estão ligadas à disseminação de notícias falsas. A CPMI das Fake News foi criada justamente com o propósito de investigar a manipulação cibernética no pleito de 2018 e conseguiu desbaratar esquemas que continuaram ativos mesmo após a posse, mas ainda não deixou legado concreto para a votação que se avizinha.
A legislação brasileira começa a avançar por esse campo minado. Para as eleições deste ano, uma série de alterações buscam garantir a lisura do processo, como a exigência de registro das redes sociais e páginas dos candidatos e as limitações ao impulsionamento de propaganda eleitoral. Mas é consenso entre especialistas que o arcabouço jurídico existente é incapaz de evitar a manipulação de dados e informações.
O Código Penal, com artigos sobre calúnia e difamação, e o regramento eleitoral não conseguem fazer frente ao problema, especialmente sem o comprometimento das gigantes da internet, como Google e Facebook, para identificar e punir os intrincados esquemas de anúncios automáticos, venda de dados pessoais de usuários e fazendas de likes que se utilizam das suas plataformas para corroer a democracia. Ao mesmo tempo em que cobram medidas de empresas e do TSE, no entanto, candidatos e eleitores devem assumir sua parcela de responsabilidade na higidez das eleições, ao não alimentar boatos e inverdades. Nessa tarefa cívica, terão o jornalismo profissional como aliado.
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