É hora de o Espírito Santo entrar nos trilhos. A metáfora tem um aspecto óbvio, de que a ampliação do modal ferroviário é essencial para conectar o Estado aos centros produtores do país e, assim, fazer crescer sua economia. Mas a figura de linguagem também traz uma sutileza: a de uma cobrança às lideranças políticas capixabas no sentido de brigar com mais veemência pela modernização da infraestrutura local.
Eis o exemplo da Ferrovia Vitória-Rio (EF 118), cuja primeira etapa consiste no ramal que vai ligar Cariacica e Anchieta. A viabilização da construção surgiu com o investimento cruzado previsto na concessão da Estrada de Ferro Vitória a Minas (EFVM), da Vale. O contrato de renovação da concessão, inclusive, foi assinado em dezembro do ano passado. O projeto desse primeiro trecho, contudo, ainda engatinha para ser incluído no rol dos investimentos obrigatórios, diferentemente do caso da construção da Ferrovia de Integração do Centro-Oeste (Fico), entre Goiás e Mato Grosso, cujas obras já foram até inauguradas em setembro pelo presidente Jair Bolsonaro. A previsão era de que a assinatura do contrato de construção do trecho capixaba saísse em setembro, o que não ocorreu.
Isso porque nem se trata da conexão férrea completa até o Rio de Janeiro, mas a primeira parte dela, com meros 72 quilômetros de extensão. A comunicação ferroviária entre os Estados vizinhos não é um capricho: faz parte de uma estratégia de logística que vai beneficiar o país, com a ampliação da malha em uma região com potencial de desenvolvimento portuário. Mais competitividade e produtividade, com diversificação econômica e geração de empregos.
Em outra linha de frente, está a construção do contorno da Serra do Tigre, em Minas Gerais, um projeto capaz de ampliar o escoamento de cargas pelos portos capixabas, sobretudo as do agronegócio, no Corredor Centro-Leste. É aumentar o desempenho da economia brasileira, com o Espírito Santo apto a concorrer com portos de Ilhéus (BA) e Santos (SP). Os investimentos na construção da extensão ferroviária também serão possíveis com a prorrogação do contrato de concessão da FCA, que está para ser firmada.
Estudo da Fundação Dom Cabral, encomendado pela Federação das Indústrias do Espírito Santo (Findes), aponta que o contorno da Serra do Tigre pode gerar um volume de 22 milhões de toneladas de carga por ano em 2035. Atualmente, esse número é de 5 milhões. O setor empresarial capixaba precisa contar com o engajamento do governo estadual e, sobretudo, da bancada em Brasília, para que essa oportunidade não seja perdida.
Nesse meio tempo, o Ministério da Infraestrutura acaba de fechar o Setembro Ferroviário, levado a cabo pela Medida Provisória nº 1.065/2021, o instrumento de outorga que possibilitou requerimentos de entes privados interessados em construir e operar novas ferrovias no país. No Espírito Santo, três planos de ferrovias privadas foram contemplados, com investimentos em torno de R$ 23 bilhões. A viabilização de investimentos privados no setor é mais que bem-vinda, mas os projetos apresentados ainda estão em um nível muito embrionário, sem previsão de sair do papel nos próximos dez anos.
A medida provisória editada pelo governo federal acabou mobilizando o Congresso a tirar da gaveta o marco legal do setor ferroviário, uma proposta apresentada em 2018. Nesta terça-feira (5), o texto foi aprovado pelo Senado e enviado à Câmara. O objetivo é reduzir a participação do poder público com o regime de autorização, no qual é permitido à iniciativa privada construir e comprar ferrovias, além de explorar o transporte em caráter privado. Um modelo diferente da concessão.
No plano das intenções, há projetos ferroviários importantes, bem como ações governamentais e legislativas para propiciar segurança jurídica e atrair investimentos privados, fundamentais no desenvolvimento da infraestrutura. Mas, para quem está interessado em ver o Espírito Santo destravar seus gargalos, o compasso ainda é de espera de resultados concretos, principalmente relacionados ao início das obras da EF 118. Sem uma atuação integrada, na forma de um movimento político-empresarial que envolva também pessoas de destaque na sociedade civil, o embarque nesse trem do desenvolvimento pode demorar ainda mais.
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