Quem passa pela Praça da Família, em Jardim Carapina, e vê crianças brincando ou praticando esportes pode não se dar conta de que, até pouco tempo atrás, essa cena tão banal em muitos bairros residenciais não era comum no local. Com índices de violência entre os mais altos do Espírito Santo, a rotina do bairro era de restrições e medo. Hoje, a realidade é bem diferente. Na contramão dos dados do Estado, que apontam alta no número de assassinatos, Jardim Carapina não registra nenhum homicídio há um ano.
A razão primeira para essa mudança que surpreende até mesmo agentes das forças de segurança é o trabalho de investigação e inteligência das polícias Civil e Militar no desbaratamento de facções criminosas. Nada menos do que seis gangues disputavam o comércio de drogas no bairro. A prisão de líderes do narcotráfico e alta taxa de elucidação de homicídios, como pregam as cartilhas bem-sucedidas de segurança pública, mostraram os resultados esperados, com retorno imediato para a qualidade de vida da população.
De acordo com o titular da Delegacia Homicídios e de Proteção à Pessoa (DHPP) da Serra, delegado Rodrigo Sandi Mori, em entrevista à TV Gazeta, todos os inquéritos sobre os assassinatos ocorridos em 2018 e 2019 foram concluídos com a indicação de autoria. Além disso, 20 homicidas de alta periculosidade foram presos em um período de pouco mais de um ano. Dos 10 suspeitos de participação na morte de Ronan Beloti de Oliveira, último assassinato registrado em Jardim Carapina, oito já estão atrás das grades. O oitavo suspeito, capturado nesta semana, é considerado um dos criminosos mais perigosos do município.
A receita de sucesso em Jardim Carapina, infelizmente, não tem se replicado em outras comunidades do Espírito Santo, que sofrem continuamente com os conflitos de gangues. No dia 21 de novembro, o Estado já havia registrado mais de mil assassinatos, ultrapassando o número de homicídios ocorridos ao longo de todo o ano de 2019, quando houve 978 ocorrências desse tipo. Fechou o mês passado com 1.019 mortes violentas, quase 600 delas apenas na Grande Vitória.
Não à tão, a segurança pública foi apontada como uma das maiores preocupações dos eleitores na Região Metropolitana, às vésperas das eleições municipais. Essa agenda pode ter contribuído, inclusive, para alçar um delegado, Lorenzo Pazolini (Republicanos), para o comando da Prefeitura de Vitória, e um ex-investigador da Polícia Civil, Euclério Sampaio, para o Executivo de Cariacica.
Embora a competência constitucional para atuar no combate direto à criminalidade seja dos Estados, os municípios têm papel crucial. Se é fato que a prisão de criminosos leva ao aumento da qualidade de vida da população, como demonstrado em Jardim Carapina, o contrário também é verdade. A melhoria do bem-estar de uma comunidade colabora significativamente para a redução dos crimes. A violência é um problema de segurança pública, mas também socioeconômico. E é aqui que os prefeitos recém-eleitos têm o dever de intervir.
Diversos estudos já comprovaram a relação direta entre medidas relativamente simples, como iluminação pública, acesso a serviços públicos e saneamento básico na queda da criminalidade. Isso sem falar no óbvio poder transformador da educação e da geração de renda. O ordenamento do espaço urbano, freando ocupações irregulares ao antecipar-se ao crescimento da cidade com infraestrutura adequada, é outra postura que atenuaria não apenas a violência, mas uma série de outras mazelas.
A atuação das forças de segurança é absolutamente necessária na desarticulação do narcotráfico, e seus efeitos são bastante mensuráveis no combate à violência em Jardim Carapina. Mas o bairro, que há alguns anos reclamava, com razão, de graves déficits na infraestrutura, também recebeu investimentos em regularização fundiária, pavimentação e drenagem de ruas, projetos culturais e esportivos voltados a crianças e adolescentes. A Praça da Família, recentemente reformada e bem iluminada, certamente contribui para que as cenas de crianças brincando tornem-se cada vez mais normais. Que essas duas frentes, a da estratégia policial e a das políticas sociais, sejam multiplicadas por outros pontos do Espírito Santo.
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