A desolação que uma obra pública paralisada provoca no contribuinte é do tamanho da ineficiência do poder público, como provedor do abrigo estatal. Um levantamento do Tribunal de Contas do Espírito Santo (TCES), com dados computados até outubro de 2020, aponta que há 290 canteiros de obras abandonados no Estado, de responsabilidade de prefeituras e do governo estadual. Investimentos públicos de R$ 592 milhões que se deterioram com o tempo, a olhos vistos, e contribuem para acentuar a precariedade dos serviços prestados à população.
No âmbito estadual, a maior parte dos 67 projetos interrompidos são de infraestrutura e transporte, perpetuando os gargalos logísticos que impedem o avanço econômico e a mobilidade. No levantamento, estão listadas 33 iniciativas de responsabilidade do Departamento de Estradas de Rodagem (DER-ES), o que representa 46% do total de projetos estaduais parados.
Já sob a alçada das administrações municipais estão 219 obras, com Cariacica e Vitória liderando os municípios com mais projetos estagnados, uma soma que chega a 25 em cada cidade. Trata-se, sobretudo, de investimentos em urbanização e saneamento, obras que melhoram diretamente a qualidade de vida dos moradores.
Em dezembro de 2019, na ocasião da posse de Rodrigo Chamoun na presidência do Tribunal de Contas, o Espírito Santo registrava 540 obras descontinuadas, sob a promessa de um pente-fino do órgão. O levantamento atual mostra pouco mais da metade desse número, mas das 290 obras listadas, os próprios órgãos responsáveis admitem não haver planejamento de retomada para 167 delas.
É um paradoxo: em muitos casos, recomeçar uma obra pode trazer ainda mais prejuízos, mas não fazer nada aprofunda ainda mais a sensação de desperdício com o dinheiro público. Decisões administrativas precisam ser rápidas e eficientes, mas sofrem também o impacto da falta de estudos aprofundados de viabilidade e da judicialização.
Tanto que, pela primeira vez, o Tribunal de Contas listou os principais motivos da paradeira: "abandono da obra pela contratada", "questões técnicas que vieram a ser conhecidas somente após a licitação", "contingenciamento de recursos próprios", "dificuldade de execução conforme previsto em projeto" e "incapacidade técnica da contratada" foram os termos mais encontrados.
As obras públicas sofrem de um mal planejamento que tem impacto sobre toda a sua trajetória, não necessariamente a escassez de recursos. As questões técnicas se sobressaem pela simples falta de um acompanhamento mais rigoroso, que impeça que mais à frente projetos mal elaborados sejam alvo de suspensões e rescisões de contrato. Mas é fato que quando começa errado, a chance de se ajustar a rota no percurso é mais difícil. Deficiências prévias e não consideradas são determinantes para atrapalhar o cronograma de execução de uma obra. E assim se passam anos.
Os processos licitatórios ganharam recentemente regulamentação mais arrojada com a nova Lei das Licitações e Contratos (nº 14.133/2021), que promete reforçar mecanismos de boa gestão e melhorar as relações entre o setor público e o privado com mais transparência. Espera-se, assim, mais eficiência nas contratações governamentais, com mais segurança jurídica. O mau uso dos recursos públicos é tão danoso para o Estado brasileiro quanto a corrupção. E a própria incompetência na gestão abre brechas para fraudes, engrossando o caldo do desperdício.
Obras públicas enchem os olhos de qualquer gestor público, por serem um capital eleitoral valioso, mas precisam ser viáveis do ponto de vista da execução, para não haver surpresas desagradáveis pelo caminho. A sanha por cortar a faixa no final de um mandato não pode ser maior do que o compromisso de entregar uma obra de qualidade e funcional para o cidadão, que é quem paga por ela.
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