Não é apenas estar desempregado, situação que atingiu 263 mil pessoas no Espírito Santo em 2020, mas jogar a toalha, sem expectativas de ver a própria situação melhorar. O avanço de 40,54% no número de desalentados — pessoas que desistiram de procurar um emprego — no Estado em 2020, no comparativo com o ano anterior, é um retrato nítido de como a pandemia tem sido avassaladora no campo social, afora toda a tragédia de saúde pública.
Os 52 mil desalentados do Espírito Santo no ano passado encontraram mais portas fechadas do que o habitual, com a atividade econômica em marcha lenta e sem perspectivas de retomada, diante de outro desalento que foi e continua sendo o enfrentamento da pandemia no nível federal. Não por pouco, foi o ano com o maior número de desalentados no Estado desde 2012, segundo série histórica da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNAD Contínua) do IBGE.
Os desalentados integram a força de trabalho potencial do país e não se enquadram no mercado por falta de qualificação e experiência, o que faz com que procurem vagas sem obter sucesso, ou simplesmente por não haver oferta de empregos. Acabam desistindo. É o nível mais dramático da falta de oportunidades, por empurrar uma parcela considerável da população aos riscos da vulnerabilidade social. Uma situação agravada pela pandemia, mas que já vinha se desenhando com tintas carregadas no desenrolar do período recessivo que teve início na metade da última década.
A distribuição do auxílio emergencial pode ter contribuído para esse aumento, até porque está na própria natureza do benefício servir como um colchão para quem estava ou está impossibilitado de trabalhar. No ano passado, durante muitos períodos as restrições de circulação por si só impossibilitavam a busca ativa por vagas de emprego. Assim como cresceram as dificuldades de se iniciar um empreendimento informal para garantir o sustento.
O enfraquecimento econômico, na forma crônica como se instalou no Brasil, esfacela o mercado de trabalho, com incapacidade de absorver quem precisa se recolocar. Sem educação de qualidade, a falta de capacitação esmaga ainda mais as já escassas oportunidades. E assim se forma um círculo vicioso que a cada novo giro se torna ainda mais devastador para a economia e, consequentemente, para a população economicamente ativa.
Mas vale reforçar que o desalento não atinge somente os mais pobres e com baixa escolaridade. Também engrossam essas fileiras os universitários e técnicos recém-formados, sem perspectivas de iniciarem as carreiras para as quais se prepararam, assim como os idosos ainda em condições de trabalho, deslocados pela competitividade com os mais jovens. A incapacidade de inserção no mercado de trabalho, quando perdura demasiadamente, alimenta o desalento.
O poder público, no papel do Estado brasileiro, precisa estar atento a essas demandas e se posicionar como o indutor do crescimento. Mesmo que a superação da pandemia encabece a agenda, é necessário começar a organizar a casa com reformas estruturantes, sobretudo em função de a crise sanitária ter demandado uma atuação estatal mais vigorosa.
A modernização tributária e a remodelação estatal são primordiais para tornar o país mais atraente aos investimentos, bem como a efetivação das privatizações e concessões. Empregos não surgem como mágica, são resultado de uma conjunção de fatores que criam um ambiente propício aos negócios. O cenário é de terra arrasada, mas é reversível se o país for recolocado nos eixos.
A força de um país está nas suas pessoas e na sua capacidade produtiva, e o Brasil segue desperdiçando esse potencial com uma educação frágil, que acumula avanços e recuos, sem se consolidar como o motor de desenvolvimento como é encarada em qualquer país que a trata com seriedade. Os desalentados são a face desse fracasso nacional, com um exército que poderia estar produzindo riquezas para o país dentro de casa, desorientado e sem perspectiva.
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