Idosos vivem cada vez mais. É preciso garantir também que vivam melhor

A sociedade tem um compromisso inalienável com os mais velhos e deve estar atenta à sistematização da violência, cobrando punições e denunciando indícios de maus-tratos ou tentativas de subtração patrimonial

Publicado em 31/05/2021 às 02h03
Idoso
A subnotificação sempre ronda casos de violência doméstica, não só contra os idosos. Crédito: Sabine van Erp/ Pixabay

A informação de que houve queda de 15% nas denúncias de maus-tratos contra idosos na Grande Vitória em 2020 à primeira vista parece uma boa notícia, que infelizmente não se sustenta quando se analisa o contexto. A população idosa foi a mais afetada no primeiro ano da pandemia por concentrar a maior parte dos registros de casos graves e de letalidade da Covid-19. A necessidade de isolamento como forma de garantir a saúde também pode ter contribuído para o silenciamento das vítimas, ao encontrar mais obstáculos para denunciarem possíveis violências dentro de casa. 

A ponderação é feita pela própria a delegada titular da Delegacia Especializada de Proteção ao Idoso (Depi), Milena Girelli: "As vítimas estão dentro de casa. Quanto mais restrições, menor é a quantidade de denúncias. Em março deste ano, por exemplo, quando as medidas de restrições foram intensificadas, houve uma queda de 50% no número de denúncias".

No comparativo de 2019 com 2020, os registros caíram de 2.393 denúncias para 1.991 no ano seguinte. A subnotificação sempre ronda casos de violência doméstica, não só contra os idosos: as mulheres e as crianças também sofrem com esse tipo de silenciamento.

A família, que tem a responsabilidade de manter a integridade física e emocional desses idosos, muitas vezes pode ser a própria algoz. Uma violência que vai além das agressões físicas, como o abandono material. Pessoas da terceira idade também são vítimas de alienação, colocadas nessa situação por alguém de sua confiança. Há a imposição de um afastamento do idoso do convívio familiar, numa situação na qual a denúncia só é possível de ser feita por terceiros. Não raro, há disputas por heranças em jogo. 

Há quase 20 anos, o Estatuto do Idoso foi instituído para garantir mais proteção às pessoas com mais de 60 anos no país, considerado desde então uma importante ferramenta de proteção e inclusão social. Com a mudança do perfil demográfico brasileiro, a premissa é de que as pessoas vivem cada vez mais, mas precisam também viver cada vez melhor. Os abusos, contudo, não cessam. Em abril, a Câmara dos Deputados aprovou projeto de lei com penas mais duras para o crime de expor a perigo a integridade e a saúde do idoso, em casos de submissão a condições desumanas ou degradantes, com a privação de alimentos e cuidados indispensáveis.

Há uma recomendação, publicada em julho do ano passado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), para que os cartórios fiquem atentos a indícios de qualquer tipo de violência patrimonial contra idosos. Caso existam suspeitas, elas devem ser comunicadas ao Conselho Municipal do Idoso, à Defensoria Pública, à Polícia Civil ou ao Ministério Público. As tentativas de antecipação de herança, movimentação indevida de contas bancárias e venda de imóveis também são uma forma de violência.

Fora do ambiente familiar, a população idosa também está vulnerável a golpes e violência. Na semana passada, uma jovem de 21 anos foi presa, suspeita de ter assassinado com pelo menos 16 facadas um aposentado de 87 anos, na Serra. O crime ocorreu em março passado. Segundo a polícia, eles teriam um relacionamento amoroso. A jovem teria cometido o crime após o idoso ter negado a ela R$ 20. Em abril, um outro caso de homicídio: um homem de 70 anos foi morto ao tentar impedir o roubo de porcos em sua propriedade, em Santa Teresa. No mesmo mês, dois idosos foram mortos a marretadas por um cadeirante, em uma casa de reabilitação em Vila Velha.

O amparo legal e a garantia de proteção aos idosos são uma questão de cidadania. Ninguém se torna cidadão de segunda classe por envelhecer, gozando ou não de plena saúde. A sociedade tem um compromisso inalienável com os mais velhos e deve estar atenta à sistematização da violência, cobrando punições e denunciando indícios de maus-tratos ou tentativas de subtração patrimonial. É papel do Estado também cuidar de seus idosos, permitindo um envelhecimento saudável e digno.

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