Não é uma surpresa a reviravolta provocada pela pandemia nas despesas dos municípios capixabas em 2020. O foco no setor de saúde se impôs às gestões locais, que precisaram se adaptar às demandas da crise sanitária com a ampliação da oferta de serviços médicos. De acordo com pesquisa da Revista Finanças dos Municípios, as cidades do Espírito Santo receberam R$ 861,6 milhões do governo federal para enfrentar a pandemia. Desse total, R$ 540,7 milhões tinham aplicação específica em saúde e assistência social, o que se justifica pelo próprio contexto.
Com as medidas de restrição de circulação, as escolas deixaram de ser frequentadas durante quase todo o ano, o que teve impacto direto no custeio. Houve a redução de gastos com água, energia elétrica, materiais de consumo, transporte escolar. E até mesmo com pessoal, com a interrupção da contratação de temporários e serviços de administração. A proibição dos reajustes de salários, uma contrapartida à ajuda federal naquele momento, também tirou a pressão sobre o setor.
Assim, fica evidente a razão da queda de 9% nas despesas com educação. Seis municípios capixabas nem sequer conseguiram atingir o percentual mínimo de 25% das receitas destinadas à área, como manda a Constituição. Dores do Rio Preto, Vila Velha, João Neiva, Mimoso do Sul, Pedro Canário e Rio Novo do Sul ficaram nessa situação arriscada, que pode fazer com que o município tenha suas contas rejeitadas pelo Tribunal de Contas do Estado e o prefeito fique sujeito à inelegibilidade e a processo por crime de responsabilidade.
Contudo, tramita no Congresso a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 13/2021 que isenta gestores municipais e estaduais de possíveis penalidades pela não aplicação da reserva de 25% em educação no ano de 2020. Em julho, o Tribunal de Contas do Espírito Santo (TCES) autorizou que três cidades capixabas que em 2020 investiram abaixo da cota mínima constitucional recebam transferências voluntárias de convênios e obras realizadas em parceria com o governo do Estado.
Por mais excepcional que tenha sido a gestão dos gastos municipais no primeiro ano da pandemia, o que talvez justifique a flexibilização das medidas punitivas, a educação foi e continua sendo um dos setores mais impactados. Racionalmente, se o dinheiro não gasto no custeio tivesse sido alocado em investimentos na qualidade do ensino remoto, os danos na aprendizagem que já começam a ser quantificados fossem menores.
Um diagnóstico realizado pela Secretaria de Estado da Educação (Sedu) apontou queda de aprendizado no ensino fundamental. "Vemos com muita clareza o impacto que a pandemia trouxe sobre o aprendizado. Isso não é nenhuma novidade. Todos os estudos e projeções já mostravam essa tendência. Agora precisamos nos planejar para fazer uma intervenção", disse o secretário Vitor de Angelo. Muitos municípios, responsáveis pela educação básica, realizaram avaliações similares que também apontaram o problema.
Os gastos com educação, mesmo no contexto pandêmico, não se tornaram dispensáveis, apenas mudaram de foco. Investimentos em tecnologia e infraestrutura para melhorar o acesso digital teriam sido de suma importância. A capacitação dos professores para o ensino remoto também teria sido um bom destino do dinheiro. Novas aplicações de dinheiro público que exigem decisões ágeis dos gestores, mesmo em meio ao caos.
Um levantamento do Unicef trouxe números alarmantes: em 2020, mais de 77 mil crianças e adolescentes ficaram de fora da escola no Espírito Santo devido à crise sanitária. O número se refere tanto aos alunos que abandonaram os estudos quanto àqueles que não tiveram acesso a materiais de atividades não presenciais. A pandemia provocou um apagão educacional no ensino público, atingido de formas diferentes. Certo é que municípios que alocaram seus recursos no aprimoramento do ensino remoto no momento adequado tiveram menos prejuízos educacionais.
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