Em meio a uma excelente e aguardada notícia para o Espírito Santo — a aprovação do pacote de concessão da BR 262 e da BR 381 em Minas Gerais pelo Tribunal de Contas da União (TCU), o que deve garantir a realização do leilão ainda em 2021 —, uma outra sobre as regras para a cobrança do pedágio nas rodovias concedidas sinaliza as intenções populistas do governo Bolsonaro, de olho em 2022.
Isso porque o TCU também aprovou a isenção da cobrança da tarifa para motociclistas, uma nova diretriz do Ministério da Infraestrutura incluída na proposta feita pela Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT). Mesmo com pareceres desfavoráveis da área técnica do TCU e do Ministério Público de Contas, a vantagem aos condutores de motocicletas foi aceita, sendo associada a um benefício social pelo fato de muitos usuários dos veículos serem pessoas de baixa renda. O privilégio deve se tornar a regra na cobrança de pedágio de todas as concessões a partir de agora.
Sim, o acesso a motocicletas de baixo custo é a viabilidade de transporte para uma parcela cada vez maior da população, e pelas circunstâncias atuais se tornou também uma importante fonte de renda. Os aplicativos de entrega ganharam ainda mais impulso na pandemia, consequentemente sendo uma alternativa de trabalho diante da escassez de vagas formais.
De acordo com a Federação Nacional da Distribuição de Veículos Automotores (Fenabrave), a venda de motos no país cresceu aproximadamente 50% de janeiro a junho de 2021, em comparação com o mesmo período de 2020. A expectativa é de que 1,06 milhão de unidades sejam vendidas neste ano.
Mas conceder a isenção a todo motociclista é dar o mesmo benefício ao trabalhador que faz uso do veículo por falta de alternativa e ao usuário de modelos que podem ser mais caros do que muitos automóveis. A tarifa para motos já é mais baixa nas praças de pedágio justamente para permitir uma divisão mais equânime. Sem a arrecadação dos motociclistas, a cobrança deve ter um encarecimento de 1% para os demais motoristas, segundo o governo. Já a Associação Brasileira de Concessionárias de Rodovias (ABCR) afirma que o impacto será maior, de 5%.
Com a isenção dada a um grupo específico de veículos, os demais condutores vão arcar com a diferença para bancar os investimentos em obras, benfeitorias e manutenção nas rodovias sob concessão privada. Não há efeito no caixa do governo, tampouco prejuízo para as concessionárias, que simplesmente vão transferir a conta para o bolso do contribuinte.
Os defensores da medida alegam que o fluxo de motos já é menos significativo nas estradas, o que por si só já seria razão para não se levar a cabo tamanho absurdo. Ao mesmo tempo, o índice de acidentes envolvendo esses veículos é alto, cerca de 20% dos registros em rodovias sob concessão, segundo a ABCR, demandando atendimento que é prestado pelas concessionárias. Há um custo envolvido.
A liberação das cancelas para motociclistas é descaradamente uma atitude política de Jair Bolsonaro, encantado com a mobilização promovida por suas "motociatas" nos últimos meses. Uma ingerência no setor de infraestrutura, que deveria se pautar por aspectos técnicos para modernização das estradas brasileiras. O importante para o país é garantir rodovias seguras para quem trafega por elas, de moto, carro ou caminhão.
Bolsonaro coloca o próprio modelo de concessões em descrédito ao beneficiar um grupo economicamente tão heterogêneo com a desculpa de uma suposta justiça social, como se não ficasse evidente que o objetivo é beneficiar seus apoiadores de capacete. Mais uma demonstração de que o presidente sabe ser o maior sabotador de seu próprio governo, nas vezes em que ele começa a acertar.
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