Em uma semana marcada por episódios insólitos, o Executivo federal decidiu praticamente inviabilizar a aplicação da Lei de Acesso à Informação (LAI) com justificativas que se relacionam diretamente à quarentena decorrente da pandemia do novo coronavírus. Justamente a medida, adotada em todo o mundo, que o próprio presidente Jair Bolsonaro tratou de colocar em xeque mais tarde, no fatídico pronunciamento em cadeia de rádio e TV na terça-feira (24). Em meio a tantas urgências, uma Medida Provisória, editada na calada da noite, determinou a suspensão de atendimentos de pedidos a todos os órgãos e entidades da administração pública nos quais os servidores estivessem sujeitos ao regime de home office. Pela regra, o prazo de respostas é de no máximo 30 dias.
Com a transparência das ações da gestão pública do país em risco, diversas entidades se mobilizaram e recorreram ao Supremo. Nesta quinta-feira (26), o ministro Alexandre de Moraes acolheu o pedido da Ordem dos Advogados do Brasil e decidiu suspender o trecho mais controverso da MP, que previa a suspensão dos prazos de resposta até o fim da vigência do estado de calamidade pública no país, previsto para dezembro. O texto também impunha a necessidade de renovação dos pedidos após esse prazo. Para restringir ainda mais a legislação, em vigor no país desde 2012, a nova regra indicava que recursos interpostos contra as negativas aos pedidos não teriam publicidade.
O retrocesso da medida, caso não houvesse pronta reação, seria incalculável, mesmo que por tempo determinado. Para começar, não é uma medida de primeira hora, diante de tantas ações mais importantes. E há um contexto também relevante. O congelamento da lei até dezembro se daria no momento em que serão exigidos cada vez mais gastos públicos não só na gestão da saúde em tempos de pandemia, como na necessária injeção de recursos do governo federal nos setores econômicos e sociais mais vulneráveis. Sem um mínimo controle, o estrago causado nos cofres públicos pode ser maior. Não se pode abrir brecha para a corrupção, mesmo em tempos de crises humanitárias.
O ministro, na decisão, foi enfático: "A participação política dos cidadãos em uma democracia representativa somente se fortalece em um ambiente de total visibilidade e possibilidade de exposição crítica das diversas opiniões sobre as políticas públicas adotadas pelos governantes".
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A Lei de Acesso à Informação tem sido um dos mecanismos mais satisfatórios de fiscalização da administração pública, um direito constitucional garantido a cada um dos cidadãos brasileiros. O jornalismo encontrou na legislação um aliado, abrindo arquivos e expondo o funcionamento e a estrutura do serviço público. É a LAI que abre as portas que os poderosos gostariam de manter fechadas.
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