Na ficção, quando um vilão qualquer resolve se entregar à polícia, a cena da prisão desse personagem em seguida é certa. A realidade, contudo, é bem diferente, como mostrou o episódio envolvendo o pedreiro Reinaldo Teixeira da Silva, 40 anos, no último domingo (13).
Considerado o principal suspeito de matar a técnica de enfermagem Maria de Fátima Pereira Análio da Silva, 41 anos, o pedreiro esteve espontaneamente na Delegacia Regional da Serra e no Plantão Especializado da Mulher, em Vitória. Saiu de lá como entrou, livremente.
É notório que a lei determina algumas condições para a prisão em flagrante, e elas não ocorreram no caso: o suspeito precisa ser surpreendido cometendo o crime ou ser perseguido logo após ele. Ou ser encontrado com objetos que o incriminem.
Contudo, o suspeito teria confessado o crime na visita à primeira delegacia. E há outros indícios: a filha do casal, de 17 anos, chegou a ver a mãe com a faca cravada no pescoço logo após o crime, na madrugada de sábado (12). A adolescente chegou a mandar uma mensagem desesperada no grupo da família, afirmando que o pai havia matado a mãe.
Dias antes do crime, na terça-feira (8), Maria de Fátima foi vítima de uma tentativa de estrangulamento, e a mesma adolescente teve que intervir no ataque proferido pelo pai dela.
Mesmo com a prisão em flagrante inviabilizada, o que fez falta foi uma mobilização maior da polícia, já dando início à abertura de um inquérito. Mas no Plantão Especializado da Mulher, o suspeito nem foi ouvido. A partir da oitiva de testemunhas e da coleta de provas no local do crime, a prisão preventiva poderia ter sido requerida a um juiz de plantão. Sobretudo se o suspeito representar risco às investigações e à família.
É um exemplo gritante de como o enfrentamento da violência contra a mulher ainda esbarra em certa leniência. Não se trata de passar por cima da lei, mas de fazer o máximo dentro dos seus limites para evitar a sensação de impunidade.
Quando um suspeito que se apresenta espontaneamente nem sequer é ouvido na delegacia, isso causa justa indignação. Em pleno agosto lilás, mês de aniversário da Lei Maria da Penha, acaba sendo uma derrota na luta para proteger a vida e a dignidade das mulheres.
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