Morte em ambulância também esbarra nas carências hospitalares no interior do ES

As falhas ocorridas no recebimento do jovem de 16 anos no Himaba devem ser apuradas com rigor, com a devida punição aos responsáveis. Mas episódio também provoca uma discussão sobre os riscos das transferências

Publicado em 03/05/2022 às 02h00
Himaba
Kevinn Belo Tomé da Silva, de 16 anos, morreu neste sábado (30) após uma parada cardíaca e aguardar horas para dar entrada no Himaba. Crédito: Acervo da família

morte do jovem Kevinn Belo Tomé da Silva, de 16 anos, por falta de atendimento médico na madrugada do último sábado (30) ultrapassou toda e qualquer barreira do aceitável. O adolescente, após transferência de um hospital de Cachoeiro de Itapemirim, ficou cerca de quatro horas dentro de uma ambulância no Hospital Estadual Infantil e Maternidade Alzir Bernardino Alves (Himaba), em Vila Velha, e não resistiu ao descaso.

O desespero dos familiares diante da indiferença encontrada no hospital, registrado em vídeo naquela madrugada, entrou para o grande acervo nacional das negligências do poder público com seus cidadãos da maneira mais cruel possível.

Kevinn saiu de Cachoeiro com vaga garantida no Himaba pelo setor de regulação. O secretário de Estado da Saúde, Nésio Fernandes,  apontou "negligência e omissão" no caso. "Por uma falha grave e inaceitável, as profissionais médicas intensivistas, com registro no Conselho de Medicina, e com especialidade para atender ao quadro do Kevinn, se recusaram a admiti-lo no serviço de pronto-socorro na vaga garantida ao adolescente. Já existem elementos explícitos de negligência e omissão por parte dos fatos ocorridos e da gravidade do desfecho".

As falhas ocorridas no recebimento do jovem de 16 anos no Himaba devem ser apuradas com rigor, com a devida punição aos responsáveis. Em alguma fase do processo, alguém (ou mais de uma pessoa) errou. O Brasil tem um histórico de negligências na saúde pública, mas a morte de Kevinn provoca ainda mais consternação pelo fato de ter existido uma vaga garantida para ele. Esclarecer o que provocou essa decisão infeliz de não dar o atendimento é questão de primeira ordem. A Polícia Civil já está no caso.

Kevinn era um jovem negro, de uma família sem recursos, mas cheio de sonhos. Queria ser jogador de futebol, queria ter uma namorada. Porém, seu futuro foi ceifado no ambiente no qual as vidas deveriam ser uma prioridade. A Kevinn não foi dada nem sequer a chance de sobreviver.

Mas nesse triste episódio é preciso também fazer uma reflexão sobre possíveis carências no suporte hospitalar no interior. Foi o próprio secretário de Saúde que informou que, apesar de haver hospital (infantil) e a Sesa ter ampliado a referência da pediatria, na região Sul existe uma restrição para pacientes acima de 16 anos, o que coloca as pessoas dessa faixa em um limbo, sem atendimento. Contudo, Nésio informou que  Kevinn foi transferido para Vila Velha por ter uma complicação renal. "De fato o melhor serviço para que ele pudesse ser acolhido e avaliado seria no Himaba."

Nada diminui o descaso e a falta de respeito sofridos pela família de Kevinn na porta do hospital. Mas é preciso fazer um passo a passo meticuloso do processo de transferência de pacientes do interior, para descobrir possíveis falhas e carências no sistema que vão além da negligência materializada no Himaba. É o que pode ser feito para salvar vidas e impedir que outras famílias sejam dilaceradas pela falta de amparo.

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