Na contramão das contas públicas brasileiras, no vermelho desde 2014, de crises políticas e reveses econômicos, o Espírito Santo ostenta desde 2012 o selo de bom pagador atribuído pelo Tesouro Nacional, carimbo que foi mantido no último Boletim de Finanças dos Entes Subnacionais, divulgado na segunda-feira (24). Nesse período, chegou a figurar sozinho na lista dos Estados com nota A algumas vezes, o que mostra o tamanho do desequilíbrio fiscal do país e também dá a dimensão dos esforços empreendidos em nome da saúde financeira capixaba.
Mais do que uma estrelinha no boletim em reconhecimento ao bom desempenho, a avaliação máxima do governo federal tem permitido que o Espírito Santo atravesse com um pouco mais de tranquilidade a tempestade provocada pelo novo coronavírus. A eficiência na gestão dos recursos propiciou um colchão para este momento de crise, ao manter baixo nível de endividamento e alguma poupança.
Mesmo que a nota A seja momentaneamente perdida em uma classificação futura, diante do inevitável aumento dos gastos públicos para debelar a crise sanitária e todos os impactos da pandemia neste ano, a solidez do Espírito Santo no rating da União prova que a lição foi aprendida pelos gestores. Esse legado certamente vai contribuir para que o Estado retome os tempos de bonança em prazo mais curto que seus pares.
A higidez do caixa no Estado foi conquistada a duras penas. Além da crise econômica que se abateu sobre o país, fortes ventos contrários atingiram a arrecadação capixaba nos últimos anos, como os prejuízos aos portos causado pelo fim do Fundap, a paralisação das atividades da Samarco, as secas frequentes que derrubaram o agronegócio e a queda no preço de commodities. Mesmo em um cenário adverso, o Espírito Santo mostrou ao país que é possível aliar crescimento econômico com ajuste fiscal.
Um dado importante do último boletim do Ministério da Economia é que esse equilíbrio financeiro no Espírito Santo não foi obtido à custa do estrangulamento dos investimentos. Ao contrário de outros entes federativos, que deixaram as despesas obrigatórias galoparem pelo orçamento, enquanto minaram recursos de obras e programas sociais, o Espírito Santo aumentou em 15% os investimentos de 2018 para 2019. À guisa de comparação, o índice nacional apresentou redução média de 18,6%.
As contas públicas brasileiras, que já estavam em pandarecos, sairão ainda mais combalidas no pós-pandemia. É justificável, já que os gastos com as medidas para mitigação da crise sanitária vêm acompanhados da desaceleração econômica. Com aumento das despesas e queda na receita, a Secretaria do Tesouro Nacional estima que a dívida bruta do Brasil pode fechar o ano em quase 100% do PIB. Com menos recursos, mais do que nunca impõe-se a urgência de controlar não apenas a quantidade, mas principalmente a qualidade das despesas públicas, para não deixar na mão uma grande parcela da população empobrecida com a onda de choque da pandemia.
Embora absolutamente legítimo neste momento, uma vez que é impensável perseguir números quando há vidas em jogo, o aumento dos gastos públicos não pode se tornar o novo normal, um salvo-conduto para multiplicar dispêndios obrigatórios. Como mostram as notas em seu boletim, o Espírito Santo sai na frente e deve usar a experiência para sustentar a liquidez e a credibilidade, cruciais para atrair novos negócios e criar postos de trabalho. O selo também deve servir de estímulo para que a administração do Estado busque reconhecimento nacional em outros indicadores de excelência, especialmente nas áreas de educação e saúde.
O objetivo último do equilíbrio financeiro é ter musculatura para promover desenvolvimento e equidade. Ocioso dizer que esse propósito só será alcançado a contento se o Brasil abraçar as incontornáveis missões de revisar sua estrutura administrativa e seu sistema tributário, dois grilhões que atravancam o crescimento do país.
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