Por mais que chame a atenção a presença de cinco municípios capixabas na lista das 120 cidades mais violentas do país, resultado de um levantamento realizado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) divulgado na semana passada, é importante enxergar o copo meio cheio.
Nas duas formas de ordenar os municípios, de acordo com a metodologia adotada pelo Ipea, a primeira cidade a aparecer no ranking é Cariacica, em 25º lugar na classificação pela nota geral e 41º colocada na relação quanto à taxa de homicídios. Enquanto a nota geral é baseada na média anual de homicídios, a segunda avaliação considera a taxa dessa média por 100 mil habitantes, entre 2018 e 2020.
Se houver um recuo no tempo de 16 anos, em 2005, o copo estava nitidamente meio vazio. Em um levantamento do Ipea daquele ano, baseado apenas na taxa de homicídios por 100 mil habitantes, o primeiro município capixaba a figurar na lista era a Serra, ocupando a nada honrosa primeira posição. Entre as 20 cidades brasileiras no ranking, o Espírito Santo ainda se fazia representar por Cariacica (3º), Vila Velha (7º) e Vitória (16º).
Situação bastante diferente da atual: se o Ipea em 2021 listasse apenas as 20 cidades, como em 2005, o Espírito Santo nem apareceria na relação. Depois de Cariacica, surgem Linhares (53º), Serra (71º), Vila Velha (82º) e Vitória (104º), no ranking pela nota geral. Já pela taxa de homicídios, as demais posições são as seguintes: Linhares (48º), Serra (74º), Vila Velha (86º) e Vitória (101º).
Há certamente mudanças de metodologia entre os levantamentos de 2005 e 2021 que poderiam impor variações nos cálculos, mas é evidente o avanço na segurança pública capixaba nas últimas décadas. O Espírito Santo exercia um protagonismo nacional incômodo desde os anos 90, período marcado pela violência urbana descontrolada e pelo caos no sistema prisional. Foi a partir de 2010 que políticas públicas com a maior presença do Estado começaram a se refletir na queda dos índices de homicídios, um êxito que só foi possível pela continuidade entre diferentes governos.
Em 2021, o copo está meio cheio, mas a bebida dentro dele ainda é amarga: após o triunfo de 2019, quando pela primeira vez em mais de 20 anos o Estado registrou menos de mil homicídios em um ano, 2020 viu esse número voltar a crescer. Em meio à guerra de facções criminosas que dominam bairros nos municípios da Grande Vitória, há crescimentos e recuos nos números de assassinatos, mês a mês. Quando há períodos mais violentos, cresce a apreensão sobre a efetividade das ações de repressão à criminalidade. Já quando a violência dá tréguas, cresce a expectativa de que a pacificação é possível. Recentemente, Vitória ficou um mês sem registrar homicídios. Um sopro de esperança.
O ranking do Ipea não é só um demonstrativo da violência no país: vai servir como parâmetro para a ordem de entrada de novos territórios no Programa Nacional de Enfrentamento de Homicídios e Roubos, a ser lançado pelo Ministério da Justiça e da Segurança Pública. Não há informações sobre esse novo projeto, mas a expectativa é de que seja nos moldes do "Em Frente, Brasil", criado ainda na gestão de Sergio Moro na pasta.
Cariacica foi uma das cinco cidades escolhidas em todo o país para o projeto, encerrado em abril, sem resultados concretos ou a divulgação de objetivos alcançados pelo ministério. Mesmo assim, é importante que o governo federal se mobilize para o enfrentamento da criminalidade, em sinergia com os Estados.
Dos cinco municípios listados entre os 120 mais violentos do Brasil, quatro estão na Grande Vitória, onde a criminalidade se espalha por um território urbano contínuo, de livre e fácil circulação. Já a violência em Linhares tem outras peculiaridades. O diagnóstico preciso de cada lugar é o que pode determinar o sucesso do enfrentamento da violência, não só com forças repressivas como com a presença efetiva do Estado na promoção da civilidade, com educação, saúde, lazer e urbanização. Para tanto, a ajuda federal é sempre bem-vinda.
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