São quase dois anos de pandemia, com uma CPI no meio do caminho. Nada disso impede que o governo Bolsonaro continue escolhendo a omissão diante das novas demandas que surgem dentro da crise sanitária. Quando a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) propôs que o governo federal passasse a exigir o passaporte da vacina dos viajantes que chegam ao Brasil, o órgão fazia o que se espera de quem tem a autoridade nacional para recomendar protocolos sanitários após a descoberta de uma nova variante do novo coronavírus, a Ômicron.
O presidente Jair Bolsonaro, em vez de trabalhar em consonância com essas diretrizes, preferiu seguir com uma de suas especialidades: a distorção dos fatos. Chegou a dizer que a intenção da agência era "fechar o espaço aéreo".
O ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, seguiu a mesma linha do chefe ao rechaçar a sugestão. Apoiou-se em uma frase de efeito atribuída a Bolsonaro: "Às vezes é melhor perder a vida do que perder a liberdade". Como se o presidente fosse um ícone libertário. A saúde pública, contudo, não tem tempo a perder com um individualismo que distorce as próprias noções de liberdade. O ministro, um médico, deveria ser o primeiro a saber disso.
Mas quem teve a compreensão dessa necessidade não foi um médico, mas um jurista. Mais uma vez, o Judiciário precisou ser acionado para assegurar medidas que reduzam os riscos sanitários em meio a uma nova ameaça. No sábado (11), o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Luís Roberto Barroso, determinou em caráter liminar a obrigatoriedade de comprovante de vacinação. Nesta quarta-feira (15), a Corte formou maioria para acompanhar a decisão, em julgamento que se encerra nesta quinta (16).
E como não pode faltar emoção no roteiro da série "Brasil", até um ataque hacker foi inserido na trama. A invasão aos sistemas do Ministério da Saúde derrubou a plataforma ConecteSUS, usada justamente para a comprovação da vacinação contra a Covid-19, levantando suspeitas de que teria o objetivo de dificultar a implantação do passaporte da vacina.
O Gabinete de Segurança Institucional (GSI) da Presidência da República investiga suspeita de uso de login e senha de um funcionário do governo. A apuração desse sequestro de dados é fundamental para a própria imagem do governo e para reduzir as possíveis vulnerabilidades das informações públicas.
Mesmo à revelia de um Ministério da Saúde submisso, incapaz de se impor como autoridade no setor que comanda, o passaporte vai ser adotado. Não se trata de uma coleira, como satirizou Bolsonaro. É uma política sanitária com base na ciência, totalmente razoável. Uma medida que pode barrar o vírus em sua nova versão, ou ao menos reduzir a entrada neste período de festas de fim de ano e férias. E evitar, como ressaltou Barroso, que o Brasil vire um destino do "turismo antivacina". E haverá quarentena para os viajantes brasileiros que não apresentarem o documento por terem saído do país antes da adoção do passaporte, como uma medida de transição.
São procedimentos que tornam as viagens mais burocráticas, quando todo mundo deseja mais facilidade nesse trânsito internacional. Mas os tempos ainda não são de normalidade, o mundo ainda precisa de cautela. E, para evitar retrocessos com a Ômicron, esse é um preço a se pagar para poupar vidas e garantir o prosseguimento das atividades econômicas e sociais no país.
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