Os casos mais emblemáticos de divergência entre as pesquisas eleitorais e o resultado das urnas tiveram em comum o fato de não terem conseguido captar o avanço do bolsonarismo. Na corrida para a Presidência da República e para o governo estadual, houve o crescimento dos respectivos segundos colocados para além da margem de erro. No caso do Espírito Santo, levando inclusive a um segundo turno não previsto na pesquisa. No Rio Grande do Sul e em São Paulo houve uma inversão de posições, com os candidatos ligados a Jair Bolsonaro assumindo a dianteira.
Essas são algumas das discrepâncias que ultrapassaram os limites do aceitável, sobretudo por serem fruto de sondagens realizadas por empresas com credibilidade no mercado. O Ipec é o instituto que sucedeu ao Ibope, nome que no Brasil virou sinônimo de pesquisa de opinião. E o Datafolha, desde os anos 80, acumula acertos. Em 1989, foi o primeiro instituto a anunciar que o adversário de Fernando Collor no segundo turno seria Lula, como acabou se confirmando, não Leonel Brizola.
Não é só a confiança do eleitor que sai abalada dessa coleção de resultados divergentes: os próprios institutos têm muito a perder caso a opinião pública passe a olhar as sondagens eleitorais com descrença. A idoneidade é o valor mais caro a essas empresas, com a construção de uma reputação, pesquisa após pesquisa, que garantiu a elas o lugar de destaque no mercado. Dessa forma, parece sem propósito questionar a honestidade dos institutos, pois qualquer tentativa de manipulação sujaria seus nomes de forma definitiva. Seria uma estratégia nada inteligente para o negócio.
A Rede Gazeta encomendou e foi responsável pela divulgação da pesquisa Ipec sobre a corrida estadual, divulgada na véspera do pleito, e tem total interesse de que essas imprecisões sejam abreviadas, com parâmetros aceitáveis. O jornalismo trata as pesquisas como um retrato do momento, uma projeção estatística. É um instante, não uma definição imutável.
Mas a Rede Gazeta, como veículo jornalístico, considera que a crise de precisão das pesquisas em 2022 deve acender o alerta dos institutos, com a adoção das devidas correções de rota metodológicas, caso elas sejam possíveis. A sociedade exige respostas, e algumas justificativas já foram aventadas pelas próprias empresas.
O voto útil a favor do bolsonarismo, a escolha dos indecisos, além do voto envergonhado... movimentos provocados pela própria divulgação das pesquisas na véspera. Esses levantamentos acabam motivando votos estratégicos, em muitos casos inesperados. Sem falar no alto índice de pessoas que não sabem em quem votar na sondagem espontânea, apenas na estimulada, demonstrando que o voto não está consolidado.
Até mesmo a defasagem do Censo, que só está sendo realizado a duras penas neste ano, pode estar atrapalhando os resultados das pesquisas por não haver um retrato fiel da população para definir os recortes das amostragens.
A polêmica provocada pelos resultados das pesquisas neste ano não elimina a importância dessa ferramenta eleitoral: o que os institutos precisam é estar mais atentos às mudanças na sociedade para aprimorar suas metodologias. No folclore político brasileiro, há o caso da eleição para prefeito de São Paulo em 1985, que faz lembrar que uma derrapada das pesquisas pode provocar constrangimentos, como fazer um candidato posar para uma foto no gabinete do prefeito antes da hora. O amadurecimento democrático no país fez as sondagens eleitorais evoluírem e os candidatos serem mais cautelosos.
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