Imagine, caro leitor, que você vai dar uma renovada na sua cozinha. Você acharia concebível que aquela parede que não faz mais parte do espaço planejado só fosse derrubada depois que o novo piso já tivesse sido instalado? A resposta é, obviamente, um estrondoso “jamais”. Mas foi exatamente isso que aconteceu em Presidente Kennedy, no Extremo Sul do Espírito Santo. Com a diferença de que a trapalhada não foi feita com um orçamento doméstico, mas com o dinheiro do contribuinte.
No balneário, a prefeitura achou por bem, sabe-se lá por que motivo, pavimentar um novo trecho de estrada sem a retirada de antigos postes de iluminação, que agora estão no meio de uma das vias, obrigando os motoristas a invadir a contramão. “Perigo” e “revolta” são duas palavras que podem tentar descrever a situação, mas a verdade é que o episódio é tão absurdo que fica difícil de descrever. Não há quem tente explicar. A imagem fala por si mesma.
A nota enviada pela administração do município a este jornal não dá uma resposta para a grande pergunta dos moradores: por que cargas d’água o novíssimo asfalto foi colocado antes que os postes fossem retirados? O texto diz que a prefeitura “já solicitou a remoção e realocação dos postes desta estrada”. Os kennedienses folgam em saber. Acrescenta também o Executivo municipal que “o pedido foi realizado no início das obras, mas o serviço até agora não foi feito”, o que é bastante perceptível. E finaliza dizendo que “a responsabilidade por substituição, remoção ou realocação é da concessionária EDP”.
Que a responsabilidade é da EDP, a empresa não nega. Informou que um estudo técnico para a retirada dos postes teve início após a solicitação da Prefeitura de Presidente Kennedy, em setembro. A administração pode até argumentar, o que não fez, que a demora da concessionária de energia elétrica em mover os postes de lugar estava atrasando uma importante obra para a população da cidade. Mas isso não explica por que decidiu pavimentar a via assim mesmo, antes de o caminho ser liberado.
Mal foi inaugurado, o asfalto já vai ser parcialmente destruído. Pode ser um episódio menor e anedótico, mas é um exemplar dos erros crassos que levam o Brasil a desperdiçar quase R$ 70 bilhões por ano dos cofres públicos, segundo estudo do BID de 2019. Naquele ano, a cifra representava 3,9% do PIB do país. É duas vezes o orçamento total do Bolsa Família neste ano de 2021.
São obras abandonadas, insumos médicos vencidos, equipamentos extraviados, investimentos infra ou superdimensionados que, além de não resolverem o problema a que se destinam, multiplicam os gastos de uma fonte já escassa. No caso de Presidente Kennedy, este é mais um episódio que esclarece quantos transtornos a má gestão pode causar à população. O município, que já chegou a ter o maior PIB per capita do país, com os royalties do petróleo, não consegue se desenvolver nem econômica, nem socialmente. Os cerca de 11,5 mil habitantes da pobre cidade rica querem ver a estrada para o progresso pavimentada, mas pedras, ou postes, insistem em atravancar o caminho.
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