Está em curso um levantamento nacional, realizado em 133 municípios, cuja a principal ferramenta é a realização de testes sorológicos com voluntários para mapear o contágio do novo coronavírus em todo o território do país e, a partir dos resultados, propor políticas públicas mais eficazes no combate à pandemia.
Informação, a esta altura, valiosa para se deixar de caminhar às cegas, dado o elevado índice de subnotificação, uma iniciativa louvável de reconhecimento do inimigo nesta guerra. Não se contava, contudo, com o fogo amigo: a falta de comunicação. O Ministério da Saúde, que financia o estudo, não comunicou em tempo hábil aos Estados e municípios envolvidos, e a pesquisa acabou virando caso de polícia.
No Espírito Santo, foram selecionadas quatro cidades: Vitória, Cachoeiro de Itapemirim, Colatina e São Mateus. No último, no Norte do Estado, equipes que trabalhavam na coleta de dados, selecionadas pelo Ibope, acabaram sendo encaminhadas para a delegacia na última quinta-feira (14) após denúncias da população, sob suspeita de estarem praticando algum tipo de golpe. Em um país no qual crises são oportunidades para malfeitos, a desconfiança é a única defesa. É natural que se denuncie.
Só que nesse caso nem as autoridades municipais, que poderiam confirmar as reais intenções da abordagem, estavam a par da realização do estudo na cidade. A reportagem deste jornal entrou em contato com as demais prefeituras e nenhuma delas tampouco havia sido informada sobre a atuação nos municípios escolhidos.
Trata-se de um estudo coordenado pelo Centro de Pesquisas Epidemiológicas da Universidade Federal de Pelotas (UFPEL), com o objetivo de verificar a propagação do vírus por meio da realização do exame em 250 pessoas de cada município. A primeira etapa teve início na quinta-feira (14) em todo o país e deveria ter sido encerrada no dia seguinte, o que não foi possível justamente em função dos problemas que se repetiram por todo o país.
Houve relatos de prisões em pelo menos dez cidades, como Natal (RN), Rio Verde (GO) e Imperatriz (MA). Algo que poderia ter sido evitado com um Ministério da Saúde atuante, instância governamental que, em qualquer nação que está encarando a Covid-19 com seriedade, seria a maior interessada em ter em mãos dados tão valiosos. E que, segundo o site Poder360, despendeu R$ 12 milhões para tanto.
Comunicar-se com a população e com os entes federados é medida de primeira mão em uma pandemia. A confusão em torno da realização desse levantamento tão relevante é só mais um aspecto da bagunça gerencial na coordenação nacional da saúde pública. Um dia depois da detenção de pesquisadores pela incompetência da pasta em dar publicidade ao trabalho que eles têm de realizar, mais um ministro da Saúde deixava o governo. Não há condições de o setor ser bem gerido durante a maior crise sanitária desta geração se não há um minuto de paz em Brasília. Os dois episódios se inter-relacionam e comprovam que o país está à deriva quando mais precisa de uma bússola.
É lamentável que, mesmo quando se dispõe a adotar algum método científico para nortear as ações, o governo federal consiga falhar tão solenemente. Bastava entrar em contato com antecedência com as autoridades estaduais e municipais, enviando um cronograma da realização dos levantamentos para, de forma integrada, estabelecer estratégias de comunicação de massa, para atingir o grande público.
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Mas o que se encontra no Planalto é a seletividade. A Secretaria de Comunicação Especial (Secom), que deveria fazer a ponte com os brasileiros sobre os assuntos de interesse público, mostra-se mais empenhada em mobilizar as bases do governo do que cumprir seu papel institucional. Para incendiar a sociedade, fala-se alto. Mas para estimular o cidadão a contribuir com uma ação tão importante para o enfrentamento da pandemia, resta o silêncio.
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