Soa até como certa insensibilidade exaltar a queda estatística dos feminicídios no Espírito Santo em 2022 diante dos fatos que permanecem em destaque no noticiário. Neste domingo, uma mulher sofreu queimaduras no rosto, pescoço, no peito e nas costas após o ex-companheiro tentar matá-la jogando água fervente no ouvido dela. Felizmente sem sucesso. Uma selvageria, um desprezo pela vida de alguém com quem um dia se dividiu a própria vida.
Mas é preciso reconhecer quando há avanços. O machismo e a misoginia não deixarão de existir de uma hora para outra, mas isso não invalida os esforços testemunhados na esfera pública: é um processo de resultados lentos, por ser uma mudança de cultura, mas não pode parar. Família, escola e poder público têm um compromisso conjunto de ajudar a constituir uma nova mentalidade, na qual a violência, mesmo as simbólicas, deixe de ser a solução para homens contrariados pelas mulheres.
É uma luta do dia a dia, com conscientização amparada pela rigidez das leis e pelo poder do exemplo. E é importante que os posicionamentos contra a violência de gênero, aquela que ocorre em função de relações disfuncionais tanto no âmbito privado quanto no público, façam cada vez mais barulho na sociedade.
Dados do Observatório da Segurança Pública mostram que Espírito Santo teve queda de 20,5% no número de feminicídios em 2022, na comparação com 2021. Mas houve um contraste: enquanto na Grande Vitória (-33,3%) e na Região Sul (-75%) houve queda consistente no mesmo período, a Região Norte (25%), a Serrana (50%) tiveram considerável aumento. A Região Noroeste se manteve igual, com oito mortes.
São estatísticas que podem explicar os êxitos e as falhas nas políticas públicas em cada região, se forem aprofundadas e investigadas, com a verificação de possíveis conexões causais entre a oferta de serviços que prestem apoio às possíveis vítimas, como a conscientização institucional sobre a importância da denúncia, e a redução dos casos. Sempre há o que se aprender, sempre há possibilidades de se aprimorar as políticas públicas com as experiências de sucesso.
Ainda há muito a ser feito, as notícias diárias de violência contra a mulher não podem ser banalizadas, precisam sempre chocar e causar incômodo. É insistir, investigar e punir com rigor os algozes, até que enfim se tenha a compreensão enraizada na sociedade de que nenhuma mulher tem dono. Para tanto, políticas públicas eficientes que abram caminho para a independência financeira feminina são um caminho importante.
O Espírito Santo está no caminho certo e tem a chance de reduzir ainda mais esses números, ano a ano, se não esmorecer no combate ao feminicídio. Para que, em breve, se possa comemorar uma queda expressiva a ponto de não haver nenhum caso no noticiário para macular esse momento.
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