Mesmo com todos os descalabros na condução política do país, ainda é difícil de acreditar que a Câmara dos Deputados, quatro anos depois do sepultamento das coligações partidárias, tenha achado viável ressuscitá-las sem nenhuma desfaçatez. E causa ainda mais indignação, para o eleitor do Espírito Santo em específico, que sete dos dez deputados da bancada capixaba tenham embarcado nesse retrocesso.
Resultado de um certo fisiologismo que não consegue se decompor na política nacional: quando parece que se caminha para frente, a realidade se impõe para mostrar que nada mudou. A legislatura atual, que se elegeu sob a bandeira da nova política, expressão que se mostra tão vazia de sentido, é a mesma que agora decide retornar a um sistema de coligações partidárias que é o próprio emblema da política mais arcaica praticada no país, aquela que alimenta legendas de aluguel, inconsistentes e ocas, e reduz a representatividade parlamentar.
A escolha para os cargos de vereador e deputados (estaduais e federais) é feita pelo sistema proporcional, com os eleitores escolhendo um candidato que faz parte de uma chapa de outros candidatos ao mesmo cargo. Na minirreforma eleitoral de 2017, ficou decidido que a chapa só pode ser formada por membros de um mesmo partido, e essa nova regra eleitoral só foi colocada em prática no ano passado, na formação das câmaras municipais.
Com as eleições de 2022 batendo à porta, os parlamentares têm pressa: a votação em dois turnos na Câmara e no Senado precisa se encerrar até outubro para que o retorno das coligações, ou seja, da formação de chapas com diferentes partidos, passe a valer no próximo pleito.
Neste momento, só o Senado pode evitar o retrocesso eleitoral, após a aprovação em primeiro turno da Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 125/11 na Câmara. O eleitor conta com o compromisso dos senadores - que não são escolhidos pelo voto proporcional, diga-se - para que a sua vontade na hora de votar seja respeitada, sem o risco de eleger candidatos de partidos com os quais não coaduna. Espera-se, sobretudo, que os senadores que representam o Espírito Santo se posicionem com dignidade, de acordo com o interesse comum.
O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), já manifestou posição contrária à volta das coligações, uma reação que já está sendo ensaiada na Casa não só para impedir o retorno, mas também endossando uma reforma eleitoral que justamente impeça que partidos pequenos garantam vagas a reboque dos maiores. Só assim deixará de haver estímulos à formação desenfreada de novas siglas. A pulverização de partidos só promove o atraso, pois não há compromisso com um projeto de país, seja qual for, apenas com o jogo de poder.
A Câmara dos Deputados, sob a batuta de Arthur Lira, desmoraliza-se ao bancar medida que explicitamente só beneficia os partidos, não necessariamente a representação política ou os interesses da população. Uma irresponsabilidade com o processo democrático, que precisa ser corrigida a tempo pelos senadores. O fim das coligações foi um avanço incontestável, mas ainda nem houve tempo de ser colocado em prática nas eleições para deputado. Manter a decisão de 2017 é fazer com que a democracia brasileira avance em linha reta, e não se arraste em ziguezague.
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