"Está tendo muito tiroteio, as crianças já não vão mais para a escola". O grito de uma das moradoras do bairro Nova Palestina, na região da Grande São Pedro, em Vitória, explicita uma tragédia bem brasileira, a realidade dos bairros dominados pelo tráfico, desamparados pelo poder público, na qual o principal agente transformador, a educação, acaba sempre derrotado pela rotina de violência. Como se não bastassem as deficiências de ensino e de infraestrutura educacional.
Nesta segunda-feira (13), pela manhã, um grupo de moradores interditou a Rodovia Serafim Derenzi, a via municipal que atravessa a região com mais problemas sociais da Capital, em um protesto por mais segurança. Os bairros no seu entorno ou próximos dela são aqueles com mais registros de homicídios e de tiroteios, resultados da relação conflituosa entre gangues rivais.
E os milhares de moradores desses bairros são reféns dessa violência, impedidos de levar uma vida mais tranquila e digna. A mera liberdade de circulação, um direito constitucional, encontra-se constantemente ameaçada nesses locais. Há sempre o risco de ser vítima de um tiroteio no meio do caminho.
Por tudo isso, essas vozes que ecoaram na Serafim Derenzi precisam ser ouvidas com atenção pelas autoridades de segurança pública, tanto estaduais quanto municipais. As reivindicações por mais segurança são tão justas que deveriam ser direito garantido, não um pedido. A violência é um flagelo para toda a sociedade, mas não há como negar o desamparo de quem é, literalmente, vizinho dela.
A reação desses moradores mostra que a presença do tráfico não é aceita por pessoas que trabalham, educam seus filhos e almejam uma vida melhor, com mais oportunidades. Não há conivência, mas como forma de sobrevivência, acabam se rendendo à lei do silêncio.
Um protesto na Serafim Derenzi é emblemático, por demarcar bem a existência de duas cidades de Vitória. A rodovia se insere na parte historicamente menos favorecida da cidade, margeando a região de São Pedro que, há 30 anos, era sinônimo de miséria. A situação não é mais tão extrema, a região passou por um processo de urbanização que teve um importante caráter civilizatório, mas com um país cada vez mais empobrecido, o risco de retrocesso não pode ser descartado.
A responsabilidade do poder público na contenção da criminalidade é gigantesca, e não há ação efetiva sem a oferta de serviços essenciais, com o acesso a oportunidades e ao lazer. A maior presença policial foi central entre as reivindicações. Por mais que especialistas afirmem que o policiamento ostensivo não é garantia de segurança, nesses bairros ele acaba sendo a personificação do Estado. Alguma resposta deve ser dada a esses moradores.
A Serafim Derenzi foi momentaneamente interrompida para que essas pessoas se façam ouvidas. O bairro Nova Palestina em 28 de agosto foi cenário de um ataque promovido por homens armados, que deixaram dois mortos.
Os relatos deixam escapar o terror e evidenciam as marcas da violência que se conectam, dadas as devidas proporções, à região do Oriente Médio que inspirou o nome do bairro. A sina de Nova Palestina não pode continuar arraigada ao seu nome: assim como em outros bairros violentos, os seus moradores merecem paz. Mais do que isso, é direito de todos.
Este vídeo pode te interessar
LEIA MAIS
Notou alguma informação incorreta no conteúdo de A Gazeta? Nos ajude a corrigir o mais rápido possível! Clique no botão ao lado e envie sua mensagem.
Envie sua sugestão, comentário ou crítica diretamente aos editores de A Gazeta.